60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

RECONSTRUÇAO NASAL TOTAL COM RETALHO FRONTAL PARAMEDIANO EM TRES ETAPAS APOS CANCER MULTIRECIDIVADO

Resumo

O nariz é uma estrutura facial complexa composta por várias subunidades estéticas essenciais, como as paredes laterais, dorso nasal, triângulos moles, columela, ponta e asas nasais, que não só contribuem para a estética facial, mas também para a função respiratória adequada.
O carcinoma basocelular, o tipo mais comum de câncer de pele na face, frequentemente afeta o nariz. Apesar de raramente se espalhar para outras partes do corpo, pode causar danos locais significativos e comprometer a estética facial, exigindo uma remoção cirúrgica completa.
A reconstrução nasal após a remoção de tumores cutâneos representa um desafio significativo para os cirurgiões plásticos. Burget e Menick introduziram o conceito de reconstrução baseada nas subunidades estéticas do nariz, fundamental para alcançar resultados estéticos e funcionais satisfatórios. Para lesões extensas que afetam mais de 50% de uma subunidade nasal o retalho frontal paramediano em três etapas é muitas vezes a técnica recomendada.

Introdução

O nariz é a unidade estética mais central da face e é anatomicamente composta por pele, subcutâneo e sistema musculo-aponeurotico mais superficialmente . É sustentado por uma camada intermediária de ossos nasais, cartilagens laterais superiores e cartilagens alares dentro da columela e da ponta. Internamente possui forramento mucoso (cavidade nasal) e cutaneo (vestibulo nasal). Em 1985 Menick e Burget descreveram visualmente o nariz em subunidades estéticas com base nas diferenças de elasticidade, cor, contorno e textura: paredes laterais, dorso nasal, triângulos moles, columela, ponta e asas nasais.1,2

O carcinoma basocelular é o tipo mais comum de câncer de pele e afeta principalmente a cabeça e o pescoço. Dentre os tumores cutâneos localizados na face, 30% a 35% estão no nariz .Raramente apresenta metástase ou é fatal porém é considerado maligno por invadir tecidos e estruturas vizinhas causando uma destruição local e uma desfiguração estética associada e deve ser removido cirurgicamente. 3,4

A lesão nasal muitas vezes não respeita os limites das subunidades e estas devem ser substituídas em dimensão, contorno e posicionamento como eram antes da lesão. Caso contrário os pontos de referência nasais estarão distorcidos, as vias aéreas contraídas ou obstruídas e o nariz mal posicionado. 1,2

O retalho frontal para-mediano, retalho indiano ou retalho medio-frontal foi descrito seiscentos anos antes de Cristo. Passou por inúmeros aperfeiçoamentos até chegarmos na técnica de reconstrução nasal com retalho paramediano baseado nas subunidades nasais descrito por Burget e Menick nas décadas de 80 e 90 e nos anos 2000 foi preconizada sua realização em 3 etapas cirúrgicas por Menick. 6


Objetivo

Esse trabalho é um relato de caso e tem como objetivo evidenciar a importância do conhecimento técnico na avaliação de uma lesão nasal e esclarecer as indicações e os benefícios do uso do retalho médio frontal em três etapas na reconstrução nasal.

Método

Paciente SOS, 63 anos, masculino, hipertenso, apresentava extensa lesão nasal que acometia todas as subunidades. Foram realizados três tentativas de ressecções prévias em outro serviço, com diagnostico histopatológico de Carcinoma Basocelular Infiltrativo Esclerosante Multirecidivado. (Foto 1)

Devido a complexidade do caso, foi optado por uma cirurgia preliminar onde foi realizado a ressecção da lesão seguindo os princípios oncológicos com margens de 1 cm para câncer de alto risco, sendo ressecados em espessura total e por completo a ponta nasal, dorso, columela, triângulos moles, paredes laterais e asas nasais. Na época a congelação não estava disponível.

Após 6 meses onde houve a completa cicatrização por segunda intenção, resultado histopatológico com margens livres e ausência de invasão perineural, iniciamos a primeira etapa da reconstrução nasal em três etapas como preconizado por Menick, onde procedemos com: Demarcação do defeito com um molde de embalagem metálica na área a ser reconstruída mimetizando a cobertura e o revestimento (forro) necessários. Marcação do retalho frontal paramediano com o molde, se estendendo verticalmente até sua base pedicular de 1,5 cm no canto medial do superciclio direito e adicionado 3 mm para facilitar a rotação, respeitando os limites descritos por Menick. Liberação distal para proximal do retalho de espessura total. Rotação do retalho a 180 graus sobre o defeito tendo sua parte distal dobrada e suturada ao tecido residual para ser usado como revestimento. O retalho foi fixado na área receptora com fios nylon 5.0 e pds 5.0. Na área doadora foi realizado triângulos de compensação em margens laterias, sutura de aproximação com nylon 3.0 e 4.0 e deixado área cruenta distal para cicatrização por segunda intenção. (Foto 2)

Após 3 meses foi realizado a segunda etapa da reconstrução nasal com elevação do retalho no plano subcutâneo em toda a inserção nasal, com espessura de 3 mm, separando o forro da cobertura associado ao enxerto primário tardio cartilagenoso de segmento anterior do quinto arco costal com pericôndrio para reestruturação das subunidades perdidas. (Foto 3)

Após 4 meses da segunda etapa, procedemos com a terceira etapa onde foi realizado secção do pedículo, reposicionamento do supercilio e refinamento da columela.

Resultado

As imagens (Fotos 4 e 5) representam 3 meses após terceira etapa da reconstrução nasal. Paciente se sente muito satisfeito e aliviado com resultado, sem déficit funcional, livre do câncer e em plena recuperação psicossocial.

Discussão

A reconstrução nasal é considerada um grande desafio para cirurgião plástico, uma vez que existem diversas técnicas cirúrgicas descritas disponíveis para correção dos diferentes defeitos cutâneos. Esta deve ser um processo cuidadoso e abrangente que avalia o defeito a partir da anatomia normal, o processo da doença, tratamentos anteriores e saúde geral do paciente. 1,2,5
Burget e Menick revolucionaram a cirurgia de reconstrução nasal com a introdução do conceito de subunidades estéticas do nariz, associado ao conceito da reconstrução total da subunidade estética se mais de 50% da mesma estiver acometida, contribuindo para o refinamento da cirurgia nasal e alcance de resultados mais estéticos. 1,2
Os retalhos cutâneos costumam ser preferíveis ao enxerto cutâneo, em decorrência da maior semelhança de cor e textura da pele. A escolha da técnica irá depender do diâmetro, localização e profundidade/complexidade da lesão. 11,12

Para tumores cutâneos pequenos, menores que 1,5cm, superficiais que acometam menos de 50% de uma subunidade podem ser utilizados os retalhos em avanço em V-Y, retalho bilobado, glabelar, retalho nasogeniano, romboide entre outros. É necessário lembrar que devido a complexa anatomia nasal não é incomum a ocorrência de distorção, retração e assimetrias levando a um resultado insatisfatório. 8,9
Para as lesões complexas, maiores que 1,5cm/2cm, profundas, que comprometam mais de 50% de uma subunidade, principalmente se estiver localizada a menos de 1 cm da margem da narina ou dentro da ponta ou columela e que necessitam da restauração do forro e arcabouço nasal, o retalho frontal paramediano em três etapas está indicado. Outras opções de retalhos frontais menos efetivas e estéticas, com técnicas mais complexas e maiores índices de complicações de isquemia e necrose são os retalhos de schimid, washio, up and down, galeal frontal ou uma associação do retalho frontal e glabelar ou nasogeniano. 1,2,7,8,9
A borda móvel da narina é facilmente distorcida pela tensão local. Um retalho local esmagará as substituições de cartilagens e não alcancará a ponta ou columela e um retalho nasolabial não cobre um defeito maior que 2 cm e não atingirá dorso ou ponta. A testa é área doadora ideal devido a qualidade de sua pele, tamanho e vascularização. É perfundida inferiormente pela a. supratroclear e a. suprapraorbitais e superior e lateralmente pelos vasos temporais superficiais, pós-auriculares e occipitais. 1,2,7
O retalho frontal paramediano baseia-se nos vasos supratrocleares ipsilaterais ou contralaterais, seu ponto de articulação baixo proporciona fácil alcance da aba para o defeito sem transferir o cabelo couro cabeludo. Seu pedículo estreito menor que 1,8 cm, permite fechamento primário da testa inferior, deixando qualquer defeito residual alto sob o linha do cabelo cicatriza secundariamente sem complicações. 1,2,6
A técnica tradicional em duas etapas realizava na primeira abordagem a transferência do retalho paramediano e utilizava a extremidade distal da aba do retalho dobrado sobre si mesmo para fornecer cobertura externa e revestimento interno e tentava alinhar a borda da narina e/ou columela e ambas margens nasais e não utilizava enxertos de cartilagem para estruturação. Na segunda abordagem o pedículo do retalho já era seccionado. O nariz reconstruído era grosso, disforme e sem suporte e muitas vezes vias aéreas ficavam colapsadas. 1,2,5,7
Burget e Menick descobriram que numa etapa intermediária o revestimento nasal poderia ser elevado, com base nos vasos axiais, criando uma cobertura fina e flexível. Enxertos primários e tardios de cartilagem podem ser combinados para estruturar o tecido antes da divisão do pedículo. 1,2,5,7
A técnica do retalho paramediano em três etapas permite o reparo de defeitos difíceis de espessura total, com menos lesão intranasal, menor tempo operatório, melhores resultados gerais e menor necessidade de revisões tardias. É especialmente útil em fumantes, idosos, pessoas com doenças médicas não associadas e quando os retalhos de revestimento intranasal não estão disponíveis. 1,2,5,6,7

Conclusão

O retalho frontal paramediano em 3 estágios deve ser a técnica de escolha para reconstrução de lesões nasais complexas pois ela permite com maior segurança e menor complexidade para atingir um ótimo resultado estético e funcional na confecção das subunidades nasais perdidas baseadas na anatomia normal e previa do paciente.

Referências

1- Menick FJ. Nasal reconstruction. Plast Reconstr Surg. 2010 Abr;125(4):138e-50e.
2- Burget GC, Menick FJ. The subunit principle in nasal reconstruction. Plast Reconstr Surg. 1985;76(2):239-47.
3- Bichakjian CK, Armstrong A, et al. “Guidelines of care for the management of basal cell carcinoma.” J Am Acad Dermatol 2018;78:540-59.
4- neliggan cirurgia volume 1 – tumor de pele )- pg 884 nelligan cirurgia plástica volume 1 traduzido
5- Menick FJ. A 10-year experience in nasal reconstruction with the three-stage forehead flap. Plast Reconstr Surg. 2002 Mai;109(6):1839-55;discussion:1856-61
6- Cintra HPL, Bouchama A, Holanda T, Jaimovich CA, Pitanguy I. Uso do retalhomédio-frontal na reconstrução do nariz. Rev Bras Cir Plást. 2013;28(2):212-7.
7- Restoring Nasal Lining — the Folded Forehead Flap for Lining;2009 the Menick Modified Method
8- Baker SR. Local Flaps in Facial Reconstruction, 2008- 415-450
9- Jackson IT.Local Flaps in Head and Neck Reconstruction, 101-203
10- Jacobs MA, Christenson LJ, Weaver AL, Appert DL, Phillips PK,
11- Roenigk RK, et al. Clinical outcome of cutaneous flaps versus full- thickness skin grafts after Mohs surgery on the nose. Dermatol Surg. 2010;36(1):23-30.
12- Hollier HJ, Stucker FJ. Local flaps for nasal reconstruction. Facial Plast Surg. 1994;10(4):337-48.

Palavras Chave

Reconstrução nasal

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

UERJ - Rio de Janeiro - Brasil

Autores

RAFAELLA MONTEIRO