Dados do Trabalho
Título
ECTROPIO CICATRICIAL EXTRINSECO POS-ABORDAGEM DE CARCINOMA BASOCELULAR METATIPICO: UM RELATO DE CASO
Resumo
O ectrópio cicatricial corresponde à presença de uma cicatriz na lamela anterior, que pode decorrer de traumas, queimaduras, patologias cutâneas e procedimentos cirúrgicos, a qual acaba provocando a retração tecidual e ainda pode ocasionar encurtamento da lamela anterior. Paciente masculino, 75 anos, apresentou quadro de ectrópio cicatricial extrínseco após abordagem cirúrgica de carcinoma basocelular em região malar esquerda. O procedimento proposto associou tarsal strip ao retalho de horner, mostrando resultados satisfatórios tanto em âmbito estético, quanto funcional para correção do ectrópio.
Introdução
O ectrópio representa uma alteração palpebral na qual ocorre eversão da pálpebra, mais frequentemente da inferior. O ectrópio cicatricial corresponde à presença de tecido cicatricial na lamela anterior, que pode decorrer de traumas, queimaduras, patologias cutâneas e procedimentos cirúrgicos, o que pode provocar a retração tecidual e ainda ocasionar encurtamento da lamela anterior1. As complicações oftalmológicas decorrem da exposição da conjuntiva tarsal, como epífora e conjuntivite crônica2. O tratamento objetiva evitar lesões por traumatismos devido à exposição da córnea e restabelecer a funcionalidade palpebral, tendo como repercussão ainda a recuperação da harmonização facial e reparação estética.
Objetivo
O objetivo do presente relato é apresentar um quadro de ectrópio cicatricial extrínseco decorrente da abordagem cirúrgica de um carcinoma basocelular, bem como as condutas adotadas e avaliação do sucesso da técnica cirúrgica elencada.
Método
Caso proveniente do serviço de Cirurgia Plástica do Hospital das Forças Armadas (HFA), Brasília, atendido tanto em âmbito ambulatorial, quanto na abordagem cirúrgica no Hospital Regional de Taguatinga (HRT). O relato foi elaborado a partir da análise de prontuário interno e estudo de bibliografia complementar.
Resultado
F.R., masculino, 75 anos, foi encaminhado ao serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Regional de Taguatinga pela equipe de dermatologia com queixa de lesão infraorbital à esquerda com 4 anos de evolução. Ao exame físico, apresentou lesão ulcerada, com bordos peroláceos e mal definidos, de 15x23mm distando cerca de 1,8 cm do tarso inferior, com suspeita clínica de carcinoma espinocelular (figura 01). Análise anatomopatológica apontou carcinoma basocelular ulcerado, subtipo metatípico, com nível de acometimento de derrame reticular. Paciente referiu trabalhar como mecânico e negou comorbidades, alergias, tabagismo e etilismo. O procedimento proposto foi exérese da lesão associada a enxerto de pele total, sendo a região infraclavicular esquerda o sítio doador. A cirurgia foi realizada dia 23/01/2024 e foi retirada a lesão com margens cirúrgicas periféricas e profundas livres, com 0,5 mm de margem, e realizado curativo de Brown. No 7º DPO, foi retirado o curativo de Brown e observada integração do enxerto de aproximadamente 95% (figura 02), seguindo com orientações acerca de hidratação e cuidados gerais. No 14º DPO, o enxerto apresentava sinais de maus cuidados, com presença de scleral show . No 21º DPO, paciente apresentou ectrópio cicatricial em região ocular à esquerda e a conduta foi uso de colírio e pomada oftalmológica com retorno para reavaliação. Ao 33º DPO, observou-se evolução para ectrópio cicatricial extrínseco (figurra 03), definido então como conduta cirúrgia para correção do quadro. O procedimento proposto foi abordagem com tarsal strip para correção do ectrópio e reposicionamento do tarso inferior, e retalho de Horner (transposição palpebral superior para inferior) (figura 04).
Discussão
O carcinoma basocelular representa a maioria dos acometimentos por câncer de pele não melanoma, sendo mais comum em pacientes idosos, do sexo masculino e de fototipos claros, com lesões predominantemente de cabeça e pescoço3. O carcinoma basocelular metatípico constitui uma variante mais agressiva que possui tanto características de basocelular, quanto de espinocelular, necessitando do estudo anatomopatológico para confirmação diagnóstica e orientação da conduta4. O tratamento de escolha é a abordagem cirúrgica, considerando maior chance de recidiva e maior risco de metástase, com indicação de cirurgia com margens oncológicas livres. A partir da exérese da lesão, a correção do defeito com enxerto dá-se como opção relativamente rápida e simples, em especial no caso de pacientes com risco cirúrgico e com lesões de alta chance de recorrência3.
A partir da pouca sustentação e complexidade anatômica, associadas a espessura reduzida considerada no paciente idoso, a região palpebral inferior é um sítio de fácil aparecimento de alterações a partir de procedimentos cirúrgicos associados. O ectrópio cicatricial se desenvolve a partir de uma cicatriz na pálpebra em si ou retração palpebral ocasionada por processo cicatricial em tecido adjacente, por conta da alta capacidade contrátil do tecido cicatricial1. Tal retração aparece a partir de um processo inflamatório associado à ausência de suporte palpebral.
O tarsal strip consiste em uma cantotomia lateral que secciona os tecidos da porção lateral interna da pálpebra e permite a visualização da fita tarsal, faixa de tecido conjuntivo, ao periósteo da face interna da margem lateral orbitária, o que possibilita levantamento da pálpebra inferior e recuperação da posição anatômica5, 6.
O retalho de Horner se dá a partir da transposição palpebral superior para inferior de forma linear7, diferindo de outros retalhos rotacionais que acabam com uma configuração mais curva. A incisão é feita no canto lateral externo da pálpebra, se estende até o canto medial e volta até encontrar a parte superior do defeito na porção lateral externa. É feito o descolamento do retalho e transposição do tecido para região palpebral inferior8. Para potencialização do resultado estético e funcional, pode ser realizada incisão subciliar para melhor acomodação do retalho. O procedimento é feito em tempo cirúrgico único e confere restauração da harmonização estética e da funcionalidade das estruturas envolvidas7.
A combinação das duas técnicas aumenta as chances de êxito na recuperação funcional e estética por serem abordagens complementares e passíveis de serem feitas simultaneamente. O levantamento da pálpebra decorrente do tarsal strip associado à recuperação do defeito a partir do retalho de horner, diminui ainda as chances de recorrência do quadro de ectrópio e de complicações pós-operatórias.
Conclusão
Tarsal strip associado ao retalho de Horner foram eficazes no tratamento do ectrópio cicatricial extrínseco, conferindo cicatriz discreta e resultado estético satisfatório (figura 05). Paciente segue em acompanhamento com equipe da Cirurgia Plástica, com ausência de recidiva e boa evolução.
Referências
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Palavras Chave
Ectrópio; Tarsal-Strip; Horner
Arquivos
Área
Cirurgia Plástica
Categoria
Cirurgia Plástica
Instituições
Hospital das Forças Armadas de Brasília - Distrito Federal - Brasil
Autores
THIAGO EBERHARD DUTRA, RAQUEL CRISTINA FUCHS, ADILSON ADILSON BORGES FARRAPEIRA JUNIOR, JULIANA CUNHA DA COSTA, CARLOS EDUARDO TEIXEIRA, NINA VASCONCELOS GIMENES