Dados do Trabalho
Título
FECHAMENTO DE GRANDES DEFEITOS TORACICOS COM RETALHO EM VY DO MUSCULO GRANDE DORSAL
Resumo
INTRODUÇÃO: Grandes defeitos da parede torácica são desafiadores, exigem equilíbrio entre a preservação da funcionalidade e estética. OBJETIVO: Relatar um caso de reconstrução da parede torácica após ressecção de extenso sarcoma em região antelolateral torácica. METODOLOGIA: Paciente masculino, 62 anos, branco, com surgimento de lesão irregular, não ulcerada, dolorosa e aderida em região anterolateral de hemitórax direito, com rápida progressão. Na tomografia não apresentava acometimento ósseo ou metástases. RESULTADO: Realizada ressecção em bloco com a musculatura torácica, poupados músculos intercostais e arcos costais. A técnica realizada com retalho miocutâneo do Músculo Grande Dorsal (MGD) em V-Y, que após dissecção e preservação de seu pedículo apresentou boa amplitude de movimento e fechamento do defeito da área doadora. Após 1 ano, paciente apresentou ganho de peso, melhora na dor e ampla mobilização dos MMSS. DISCUSSÃO: Os defeitos na parede torácica devem permitir a manutenção da funcionalidade da parede torácica, restaurando a anatomia de proteção aos órgãos internos e garantindo sustentação para os MMSS e dinâmica ventilatória, além de restauração estética e minimização de deformidade da área doadora. CONCLUSÃO: Retalhos utilizando o MGD com fechamento V-Y possibilita a síntese primária com baixo índice de complicações pós-operatórias e boa cobertura torácica, além de suportar os efeitos locais da radioterapia.
Introdução
A presença de grandes defeitos de parede torácica é considerada desafiadora do ponto de vista reconstrutivo, exigem equilíbrio entre a preservação da funcionalidade e estética. Ratificam a necessidade de estudo amplo das técnicas cirúrgicas disponíveis e adaptação da melhor tática para determinado indivíduo e patologia.
Os tumores da parede torácica de tecidos moles manifestam-se com frequência por massa localizada, sem outros sintomas. Vários tumores da parede torácica são encontrados incidentalmente em exames de imagem realizados por outras razões clínicas. Alguns pacientes têm febre. Habitualmente, os pacientes só sentem dor depois que o tumor está mais avançado. Em contrapartida, os tumores primários cartilaginosos e ósseos são frequentemente dolorosos 1,2,3.
Os sarcomas representam um grupo heterogêneo de tumores derivados de células de origem mesenquimal. Eles representam 1% de todas as neoplasias e ocorrem principalmente nas extremidades (60%), trato gastrintestinal (25%), retroperitônio (20%) e região da cabeça e pescoço (4,1%). Os sarcomas primários do tórax são excepcionalmente raros, representam 0,2% dos cânceres pulmonares e 5% de todas as neoplasias torácicas, e podem envolver o pulmão, o mediastino, a pleura e, principalmente, a parede torácica. A presença de sarcoma em qualquer outra parte do corpo deve ser descartada, uma vez que a metástase é muito mais frequente que o tumor primário, se tornando um desafio para as cirurgias reparadoras 4.
Em nosso relato, apresentamos um paciente que apresentou volumosa massa na região torácica anterolateral direita, cuja suspeita diagnóstica inicial apontava para sarcoma. Diante desse quadro clínico, surgiu a necessidade de traçar uma estratégia para a reconstrução adequada da parede torácica.
Objetivo
O caso relatado no atual trabalho refere-se à reconstrução da parede torácica após ressecção de extenso sarcoma em região antelolateral torácica.
Método
Paciente masculino, 62 anos, branco, portador de hipertensão arterial, apresentando tumoração em região anterolateral de hemitórax direito de evolução há 1 ano, com rápida progressão nos últimos 6 meses, marcados pelo aumento de volume da massa e perda ponderal de 15 kg nesse período.
Ao exame físico, identificava-se lesão irregular, não ulcerada, de consistência fibroelástica, dolorosa, com diâmetro aproximado de 20 cm, aderida à parede torácica (FIGURA 1), sugestiva de sarcoma de parede torácica, o qual motivou a realização de exames de imagem para o correto estadiamento oncológico do paciente. Na tomografia de tórax, evidenciou-se volumosa lesão expansiva na parede lateral do hemitórax direito, acometendo a musculatura, destacando-se os músculos peitoral maior e serrátil anterior, medindo 18 x 5,8 x 9 cm, sem acometimento ósseo ou pleural e ausência de metástases (FIGURA 2).
Após suporte nutricional e avaliação pré-operatória sobre a capacidade funcional e respiratória, paciente foi submetido ao tratamento cirúrgico sob anestesia geral e ressecção em bloco de toda a lesão, a qual englobava toda a musculatura lateral da parede torácica, poupando os músculos intercostais e arcos costais, sendo realizada também a linfadenectomia das cadeias axilares e envio da peça cirúrgica para o estudo de congelação, o qual identificou margens livres e linfonodos livres de doença. A reconstrução do defeito da parede torácica remanescente foi conduzida pela equipe da cirurgia plástica (FIGURA 3).
Resultado
A técnica utilizada foi baseada no retalho musculo-cutâneo do grande dorsal em V-Y, que após dissecção ampla do músculo grande dorsal e preservação de seu pedículo (artéria toracodorsal) obteve-se boa amplitude de movimento e fechamento integral do defeito e da área doadora (FIGURA 4). Logo, a peça cirúrgica foi analisada pela anatomia patológica, tendo como laudo histológico leiomiossarcoma de alto grau com imuno-histoquimica positiva para S100 e Ki67.
O paciente foi encaminhado para unidade intensiva durante o pós-operatório imediato, sendo encaminhado para enfermaria da cirurgia plástica após 48h de observação. Nesse período não apresentou necessidade de suporte ventilatório ou outras complicações agudas. Porém, apesar do suporte nutricional e cuidados intensivos com a ferida operatória, houve área de epidermólise da região lateral de retalho, evoluindo para necrose seca e congestão venosa, além de seroma em área doadora. No entanto, após desbridamento e controle infeccioso, o defeito remanescente apresentava diâmetro aproximado de 5 cm, o qual foi submetido à terapia com pressão negativa (curativo à vácuo), durante 03 semanas, com recuperação total da cobertura torácica e resolução completa do seroma de área doadora. O retalho manteve-se com bom aspecto e bordas coaptadas após a terapia de pressão negativa, sem déficit funcional da parede torácica, apresentando mínima retração de pele e apagamento do sulco axilar.
Paciente obteve alta após esse período, sendo encaminhado para o acompanhamento ambulatorial multidisciplinar, obtendo ganho ponderal adequado e indicado realizar tratamento radioterápico como estratégia oncológica. Já com a epitelização completa, o paciente foi submetido a radioterapia adjuvante da parede torácica.
O retalho manteve-se íntegro durante e após a radioterapia, sem solução de continuidade da pele. Após 1 ano de acompanhamento, o paciente apresentou importante ganho ponderal, além de melhora na dor local e ampla mobilização dos membros superiores, sem outras queixas (FIGURA 5).
Discussão
Os defeitos da parede torácica incluem ressecções tumorais, infecções de feridas esternais profundas, empiemas crônicos, osteorradionecrose e traumatismo. Todas essas lesões devem ser tratadas de maneira a permitir a funcionalidade da parede torácica restaurando a anatomia local promovendo proteção aos órgãos internos e garantindo a sustentação para os membros superiores e a dinâmica ventilatória 5. Os objetivos reconstrutivos incluem fechamento da ferida com manutenção da integridade intratorácica, restauração dos contornos estéticos, bem como a minimização de deformidade na área doadora.
A ressecção e reconstrução da parede torácica tem sido um desafio, porém melhorias nas técnicas cirúrgicas, anestésicas e nos cuidados intensivos permitiram que extensas ressecções da parede torácica fossem realizadas com morbidade e mortalidade aceitáveis, principalmente quando baseadas em uma história respiratória cuidadosa, levando em consideração o hábito de fumar do paciente, a exposição ocupacional e outras possíveis exposições a irritantes pulmonares que podem comprometer o desfecho do paciente 6.
No tratamento de grandes defeitos da parede torácica, os enxertos de pele simples não são uma boa opção, pois o local do defeito sobre a caixa torácica é irregular e a superfície é muito grande para integração de enxertos de pele. No entanto, os retalhos musculares e musculocutâneos dos músculos grande dorsal, peitoral maior, serrátil anterior, reto abdominal e oblíquo externo têm sido frequentemente utilizados, pois o esclarecimento da anatomia funcional e do suprimento sanguíneo desses músculos resultou em ressecções mais agressivas no tratamento de tumores da parede torácica e na melhora cirúrgica dos estragos da radioterapia. Logo, a reconstrução imediata é confiável para lidar com esses problemas 7.
O uso de retalho muscular de grande dorsal foi originalmente descrito por Tansini em 1906, quando utilizou o retalho do músculo latíssimo do dorso para cobertura da parede torácica anterior após mastectomia radical 8,9, enquanto Campbell em 1950 reconstruiu um defeito de espessura total no tórax anterior e cobriu o músculo imediatamente com um enxerto de pele de espessura parcial 10. A utilização do retalho miocutâneo tem como limitador a quantidade de pele disponível para a reconstrução, no entanto, estudos de Micali et al propuseram uma forma de desenho inovador para a ilha de pele do grande dorsal, que possibilita a obtenção de grandes ilhas triangulares, com fechamento primário em V-Y 11,12. Com esse método, foi possível reparar grandes defeitos na parede torácica anterior sem prejuízo estético e funcional.
A técnica cirúrgica é feita a partir da marcação cutânea com o paciente em pé ou em decúbito lateral oposto à lesão. Com o braço ipsilateral ao tumor abduzido a 90 graus, deve-se marcar na pele a distribuição do músculo latíssimo do dorso para que a ilha cutânea seja posicionada de maneira adequada. Deve-se determinar por meio do pinçamento bidigital quais áreas da lesão podem receber fechamento primário para possibilitar a marcação da borda anterior da ilha de pele triangular, que deve ser posicionada na borda lateral da lesão.
A seguir, marca-se um ponto na linha média da coluna, alinhado com o centro da lesão depois de unidas as extremidades do bordo de ataque da ilha de pele com o referido ponto, traçam-se os bordos laterais do triângulo; devem ser levemente curvados com as concavidades voltadas para a cabeça do paciente.
Após a ressecção, o retalho é dissecado, deslizado para frente e ligeiramente rodado para cobrir o local do defeito. Havendo tensão para posicionamento do retalho no local receptor, é possível liberar o grande dorsal de sua inserção no úmero, além de seccionar o ramo da artéria toracodorsal para o músculo serrátil. Uma vez posicionada corretamente, a parte muscular do retalho é suturada ao local do defeito com pontos separados. O tegumento cutâneo ao redor da lesão é levantado. A seguir, realiza-se o fechamento primário das áreas em que é possível fazê-lo independentemente do retalho. A seguir, sutura-se a ilha de pele e, por fim, fecha-se a área doadora. Todas as suturas são feitas nos três níveis: tecido celular subcutâneo, subdérmico e dérmico. Drenos de sucção são utilizados nas áreas doadora e receptora e mantidos por 7 a 15 dias. É uma técnica que recruta uma ilha cutânea de área muito maior do que a técnica convencional do retalho miocutâneo do grande dorsal, permitindo o fechamento de grandes defeitos mesmo em pacientes com pouca flacidez torácica 12,13,14.
O caso demonstrado utilizou o retalho miocutâneo com o músculo grande dorsal e síntese cutânea em VY comprovando a eficiência dessa técnica para o reparo de lesões extensas no tórax.
Conclusão
Portanto, retalhos miocutâneos utilizando o grande dorsal associada ao fechamento V-Y possibilitou a síntese cutânea primária com baixo índice de complicações pós-operatórias eboa cobertura torácica, além de suportar os efeitos locais da radioterapia, caso necessário, tornando-se uma ótima estratégia para o tratamento de tumores que acometem a parede anterolateral do tórax.
Referências
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Palavras Chave
Retalho Miocutâneo; Leiomiossarcoma; Parede Torácica
Arquivos
Área
Cirurgia Plástica
Categoria
Cirurgia Plástica
Instituições
Universidade do Estado do Rio de Janeiro - Rio de Janeiro - Brasil
Autores
MICHELLE GONÇALVES MAUÉS, CATERINA GOULART ALESSIO, DANIELLI RODRIGUES LEITE DA SILVA, FELIPE EDUARDO DE OLIVEIRA SANTOS, YURI BELLO SIMOES