60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

HEMANGIOMA CAVERNOSO DO LABIO: TRATAMENTO COMBINADO COM LASER INTRALESIONAL E CIRURGIA

Resumo

O hemangioma cavernoso infantil é um tumor vascular benigno na infância. Hemangiomas cavernosos têm uma tendência de crescimento lento com complicações subsequentes, como ulceração e sangramento. Nesse trabalho relatamos um caso de um grande hemangioma cavernoso afetando o lábio superior mediano em uma paciente feminina de 11 anos. A lesão estava crescendo e era dolorosa à pressão e a paciente se sentia estigmatizada. O tratamento foi desejado pela paciente e pelos pais. Após cuidadoso exame, incluindo ultrassom com Doppler, foi realizada uma abordagem combinada. Na primeira etapa, foi utilizado um laser intralesional de neodímio-YAG usando uma ponta romba, ocasionando coagulação dos vasos e retração da lesão. Na segunda etapa, imediatamente após a ação do laser, a lesão foi completamente removida por cirurgia. O fechamento do defeito foi realizado com retalhos miorcutâneos vermelhos bilaterais para expansão tecidual. A paciente foi acompanhada por 5 meses. A desfiguração e o comprometimento funcional foram eliminados. O resultado foi satisfatório tanto para a paciente quanto para os pais. Lesões vasculares no lábio superior - especialmente quando próximas ao arco de Cupido - podem se tornar desfigurantes e causar comprometimento funcional. O laser, através de suas características (Nd-YAG de 1.064nm de comprimento de onda) possui afinidade pela hemoglobina, sendo por ela absorvido e promovendo uma coagulação da lesão.
A reconstrução imediata foi realizada por retalhos bilaterais descritos por Goldsztein (retalhos de avançamento mucomiocutâneo). Esta opção reparadora, além de pousar cicatrizes em lábio cutâneo, proporcionou um resultado estético satisfatório e manutenção completa da função do músculo orbicular.
Esta associação de tratamentos mostrou ser possível associar técnicas tradicionais de tratamento cirúrgico em hemangiomas cavernosos com ferramentas efetivas e específicas como o laser, diminuindo a morbidade do procedimento, poupando tecidos sãos e diminuindo sangramento em função da especificidade do laser vascular para com a lesão alvo.

Introdução

Hemangiomas infantis são os tumores vasculares mais comuns na infância. Enquanto os hemangiomas infantis mostram regressão espontânea em 90%, os hemangiomas congênitos do tipo não involutivo (NICH) não regredirão. Hemangiomas congênitos de involução rápida (RICH) e parcial (PICH) seguem um curso diferente do NICH. Hemangiomas não regressivos podem causar complicações que variam desde desfiguração até complicações ulcerativas ou ameaçadoras à vida. O hemangioma cavernoso infantil dos lábios é um tumor vascular benigno. A lesão geralmente é macia e pode ser comprimida devido à sua natureza vascular. Hemangiomas cavernosos dos lábios tendem a crescer lentamente ao longo do tempo. Os principais sintomas relacionados a este tumor vascular são dor, inchaço, comprometimento funcional e sangramento. Como os lábios são uma parte central da estética facial devido à sua cor, textura da superfície e forma, o tratamento do hemangioma cavernoso labial deve considerar o impacto estético dos procedimentos selecionados, além de preservar a sua função.
Relatamos um caso de hemangioma cavernoso no lábio superior, prejudicando a função labial e causando desfiguração em uma menina de 11 anos. Apresentamos uma intervenção terapêutica combinada com coagulação a laser intralesional seguida de excisão completa, que ainda não foi descrita para esta indicação.

Objetivo

Este trabalho tem como objetivo relatar o caso do uso de laser intralesional associado a técnica de reconstrução de lábio em uma paciente feminina de 11 anos portadora de hemangioma cavernoso do lábio inferior.

Método

Foi relatado o caso de uma paciente pediátrica feminina de 11 anos com hemangioma cavernoso. A paciente foi submetida a exame clínico rigoroso e ecografia com Doppler. Com base nos achados clínicos e dos exames de imagem, foi elaborado o plano de tratamento combinado. A paciente foi submetida ao tratamento proposto e foi acompanhada por 5 meses, tendo resultado satisfatório. Os dados clínicos relevantes, os resultados de exames de imagem e fotografias da evolução do caso foram compilados nesse relato de caso que incluiu uma revisão da literatura.

Resultado

Relato do caso:
Achados clínicos
Uma paciente de 11 anos foi trazida em consulta pelos pais para avaliação de um hemangioma cavernoso. Sua mãe relatou que a lesão se desenvolveu quando a menina tinha 1 ano de idade. A paciente era previamente hígido e sem histórico familiar para lesões vasculares. Nenhum tratamento havia sido tentado anteriormente. A paciente relatou dor e inchaço ocasional e comprometimento funcional, além de deformidade nos lábios e, importante, angústia emocional.
Ao exame, observamos um grande hemangioma cavernoso no lábio superior, na região logo abaixo do arco de Cupido. Na palpação, estava tenso e ligeiramente dolorido (Fig. 1). Não havia outros sintomas clínicos sugestivos de uma malformação sindrômica.
Realizamos ultrassonografia Doppler diagnóstica e identificamos uma imagem oval, bem delimitada, medindo 1,0 × 0,8 cm, com fluxo arterial e venoso misto no Doppler (Fig. 2). Esses achados eram compatíveis com o diagnóstico de um hemangioma cavernoso.
Tratamento:
Uma abordagem combinada para remoção foi sugerida. Após informações detalhadas e consentimento informado da paciente e dos pais, o procedimento de remoção foi planejado sob anestesia geral. A paciente foi posicionada em decúbito dorsal, foi realizada antissepsia e foram colocadas campos estéreis.
Como os hemangiomas cavernosos têm propensão a sangrar, utilizamos um laser neodímio (Nd)-YAG de 1064 nm de pulso longo intralesional para coagulação. Uma fibra laser romba foi inserida em uma cânula e o hemangioma foi puncionado pelo lado oral do lábio superior. O laser foi usado com uma fluência de 200 J cm–2 e um tamanho de ponto de 2 mm. O ponto final foi alcançado com a coagulação do hemangioma e sua consequente retração (Fig. 3). Imediatamente depois, a lesão foi completamente excisada cirurgicamente. O procedimento foi concluído com cuidadosa hemostasia com pinças bipolares.
Para o fechamento do defeito, foram preparados retalhos vermelhos miocutâneos expansores bilaterais (técnica de Goldstein modificada por Sawada) do lábio superior. Foi dada atenção especial para evitar danos ao plexo vascular dos lábios. Esses retalhos foram avançados medialmente. Mucosa, músculo e linha cutânea da mucosa foram suturados em planos com PDS 4-0 e 5-0 e catgut simples 4-0 (Fig. 4). Após limpeza antisséptica final, foi aplicado um curativo com gaze e micropore.
A amostra cirúrgica foi transferida para histopatologia fixada em formalina a 10%. A visualização macroscópica demonstrou pele cinza e áspera e/ou cunha de mucosa, medindo 1,5 × 1,0 cm na superfície com espessura de 0,7 cm. Os cortes mostraram uma lesão nodular, cística, preenchida com conteúdo sanguíneo, medindo aproximadamente 1,0 cm ao longo do seu eixo mais longo, 0,1 cm da margem cirúrgica mais próxima. Acompanhou uma mancha irregular de pele clara com alguma hipoderme medindo 0,7 × 0,3 × 0,2 cm.
Foi realizado exame anatomopatológico da lesão retirada. Secções representativas foram incluídas em um bloco de parafina e submetidas a exame histopatológico adicional com coloração de hematoxilina e eosina. Observamos vasos sanguíneos dilatados de calibres variáveis com trombose. Os vasos eram principalmente de parede fina. O tecido conjuntivo circundante estava comprimido com células musculares lisas dispersas (Fig. 5).O diagnóstico de hemangioma cavernoso trombótico do tipo venoso capilar foi confirmado. A excisão foi completa.
Resultado e acompanhamento
A cicatrização após a cirurgia foi sem intercorrências. Não houve sangramento, inflamação ou infecção, e não foram observadas cicatrizes hipertróficas. O acompanhamento foi de 5 meses. Os controles demonstraram nenhum comprometimento funcional no lábio superior, contornos normais na vista frontal e lateral, e uma cicatriz estreita (Fig. 6). A paciente e a família ficaram satisfeitas com este resultado.

Discussão

Relatamos um hemangioma cavernoso infantil no lábio superior em uma menina de 11 anos. A lesão era óbvia ao final do primeiro ano de vida, mas aumentou posteriormente, causando desfiguração e estresse emocional. Dor e comprometimento funcional do lábio motivaram o tratamento. Hemangiomas infantis são atualmente classificados como malformações vasculares, em vez de tumores vasculares. Na imunohistoquímica, os hemangiomas infantis são positivos para transportador de glicose (GLUT)-1, ao contrário dos hemangiomas congênitos.

Pequenas lesões são efetivamente tratadas com técnica a laser usando um laser de neodímio-YAG ou laser dual-díodo. Outra opção para hemangiomas infantis é a escleroterapia usando injeção intralesional de bleomicina com 0,1–0,5 mg/kg. No entanto, isso pode resultar em ulceração. A bleomicina tem o potencial de induzir fibrose pulmonar, mas, felizmente, isso não tem sido observado no tratamento de hemangiomas. Cicatrizes deprimidas e alterações de pigmentação estão dentro do espectro de efeitos adversos dessa técnica.

Para hemangiomas maiores, a terapia sistêmica com propranolol na dose média de 1mg/kg/dia tem sido recomendada. O propranolol tem efeitos inotrópicos e cronotrópicos no coração. Portanto, o medicamento pode influenciar tanto a frequência cardíaca quanto a pressão arterial, que precisam ser monitoradas. Timolol e atenolol são alternativas. Cerca de um terço dos hemangiomas infantis apresentam recidiva após um período de tratamento de 6 meses com beta-bloqueadores. Especialmente aquelas lesões com componentes profundos, como os hemangiomas cavernosos, estão em risco.

Hemangiomas gigantes, no entanto, muitas vezes não respondem completamente à terapia medicamentosa e justificam cirurgia. Abordagens combinadas com laser e timolol tópico, beta-bloqueadores sistêmicos e bleomicina intralesional ou escleroterapia com cirurgia têm sido desenvolvidas para melhorar o resultado.

No caso presente, escolhemos a combinação de terapia a laser intralesional seguida de excisão cirúrgica completa da lesão. O lábio superior é um componente importante da estética facial. Isso argumenta contra cirurgias extensas para remoção de hemangiomas no lábio superior e outros métodos que interfiram com o ideal de estética do lábio superior.

Nossa abordagem oferece algumas vantagens nesse sentido. O laser Nd-YAG foi escolhido por sua absorção pela hemoglobina, que causa fotocoagulação nos vasos com até 7 mm de diâmetro. Este laser versátil pode ser usado intralesionalmente, com uma ponta romba inserida em uma cânula, aumentando sua eficácia para hemangiomas cavernosos. A experiência clínica destaca seu excelente perfil de segurança para lesões vasculares em geral. O laser Nd-YAG coagula os vasos do hemangioma, reduzindo o sangramento intraoperatório e limitando a ressecção desnecessária de tecido saudável. O efeito de retração tecidual é resultado da coagulação a laser. Do ponto de vista cirúrgico, especialmente no caso de uma região altamente vascularizada, a contração leva a uma cirurgia menos traumática. Isso é benéfico para a subsequente excisão completa da lesão. Assim, o processo de reconstrução e cicatrização são facilitados. O exame histopatológico demonstrou a coagulação completa (trombose) dos vasos sanguíneos dilatados dentro do hemangioma. Para o fechamento do defeito, empregamos o retalho miocutâneo vermelho expandido bilateral (técnica de Goldstein modificada por Sawada). Isso resultou em cicatrização pós-operatória sem intercorrências, com bom resultado funcional e estético. Este é o primeiro relato sobre a combinação de laser vascular intralesional seguido de excisão completa e fechamento do defeito conforme descrito.

Conclusão

Hemangioma cavernoso maior no lábio superior é melhor abordado por um tratamento combinado. Sugerimos a aplicação intralesional de laser Nd-YAG com uma fibra romba para coagular a malformação vascular sem tocar na pele ou no vermelhão dos lábios. Essa técnica reduz o sangramento intraoperatório e diminui o tamanho da subsequente excisão cirúrgica da lesão. Dessa forma, o fechamento do defeito com retalhos miocutâneos vermelhos bilaterais expansores de tecido é adequado, e a cicatrização completa da ferida é favorecida. Os resultados funcionais e estéticos são satisfatórios. Não foram observados eventos adversos.

Referências

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Palavras Chave

HEMANGIOMA; LASER

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

Hospital São Lucas da PUC-RS - Rio Grande do Sul - Brasil

Autores

JULIANA CAMPELLO BECK, ALBERTO GOLDMAN, MILTON PAULO DE OLIVEIRA, LUCAS PASTORI STEFFEN, ANDRESSA CAPELETTI ECHER, ADRIANO CALCAGNOTTO GARCIA