60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

BEM ESTAR FISICO E SOCIAL DOS PACIENTES SUBMETIDOS A RECONSTRUÇAO DEFINITIVA APOS EXERESE DE TUMOR DE FACE

Resumo

Em todo o mundo, os cânceres de pele não melanoma (CPNM) são conhecidos como um dos cânceres mais comuns. Entre 2 e 3 milhões de casos de CPNM ocorrem todos os anos e as taxas continuam aumentando. A maioria dos CPNM está localizada na cabeça e pescoço devido à alta exposição solar nessas áreas. 1
O presente estudo foi desenvolvido pelo Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Ipiranga do Estado de São Paulo. Neste trabalho foram identificados todos os pacientes submetidos à reconstrução definitiva de defeitos em face após ressecção tumoral de pele, no período de abril de 2023 a julho de de 2023.
O questionário FACE-Q avaliou o resultado da reconstrução da face por meio de 3 domínios, aplicados com 3 meses após o procedimento cirúrgico final. Um conjunto diferente de escalas avaliou a aparência do rosto (simetria, contorno, textura da pele), qualidade de vida (satisfação com o resultado, sofrimento psicossocial, função psicológica e função social) e efeitos adversos.
Os dados foram analisados através do software JASP 0.18.3 (JASP Team, 2024). As variáveis do questionário FACE-Q (qualidade de vida, aparência e efeitos adversos) foram comparados entre os grupos de tempo de reconstrução, presença/ausência de necrose parcial e os tempos cirúrgicos necessários para reconstrução total da face.
Este estudo indica que tanto os retalhos locais quanto os enxertos de pele total são opções viáveis para a reconstrução de defeitos faciais após a ressecção de CPNM. Ambas as técnicas proporcionam bons resultados estéticos, qualidade de vida e funcionalidade, além de causarem efeitos leves na área doadora.

Introdução

Em todo o mundo, os cânceres de pele não melanoma (CPNM) são conhecidos como um dos cânceres mais comuns. Entre 2 e 3 milhões de casos de CPNM ocorrem todos os anos e as taxas continuam aumentando. A maioria dos CPNM está localizada na cabeça e pescoço devido à alta exposição solar nessas áreas. 1

O tratamento dessa patologia pode implicar múltiplas modalidades, como quimioterapia, radioterapia e cirurgia, com envolvimento variado dessas funções ao longo do tempo e muitas vezes com a necessidade de complexos processos de reconstrução. A avaliação dos resultados desses procedimentos deve, portanto, considerar a opinião do médico e a perspectiva do paciente. Ao mesmo tempo, a medicina baseada em evidências levou a instrumentos validados que comparam resultados de diferentes autores.2

Essa dificuldade em avaliar o sucesso do tratamento levou ao desenvolvimento do Módulo de Câncer de Cabeça e Pescoço FACE-Q, um questionário de resultado relatado pelo paciente (PRO - abreviação do inglês patient-reported outcome) que mede a aparência, função facial, qualidade de vida e experiência de atendimento para neoplasias de cabeça e pescoço. O questionário segmenta a avaliação entre Aparência Geral da Face, Comer e Beber, Competência Oral, Salivação, Sorrir, Falar, Deglutir, Aflição pela Aparência, Preocupação com Câncer, Aflição por Babar, Aflição Alimentar, Aflição por Sorrir, Aflição por Falar e Informação.2

Embora existam diversas modalidades terapêuticas disponíveis, a cirurgia é geralmente considerada o tratamento mais eficaz do CPNM. Os principais objetivos do tratamento cirúrgico abrangem a completa remoção do tumor para prevenir a recorrência, minimizando o comprometimento funcional e otimização da aparência cosmética.3, 4




Objetivo

O objetivo deste estudo é avaliar o bem estar fisico e social de pacientes submetidos a reconstrução de face após exérese de tumor de pele desde o ponto de vista subjetivo do paciente.

Método

Desenho do Estudo e Coleta de Dados

O presente estudo foi desenvolvido pelo Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Ipiranga do Estado de São Paulo. Neste trabalho foram identificados todos os pacientes submetidos à reconstrução definitiva de defeitos em face após ressecção tumoral de pele, no período de abril de 2023 a julho de de 2023. Esses pacientes foram convidados a participar do estudo mediante assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.
Os critérios de exclusão foram perda de seguimento, incapacidade dos pacientes em preencher questionários ou reconstrução de face não concluída. O Comitê de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa aprovou este estudo.

Dados de idade, sexo, renda mensal, grau de escolaridade, comorbidades, tipo histológico do câncer de pele e estadiamento foram obtidos a partir da análise de prontuários. Dados relacionados às cirurgias também foram avaliados, como unidades estéticas da face afetadas, complicações e número total de operações por paciente.

Questionários

O questionário FACE-Q avaliou o resultado da reconstrução da face por meio de 3 domínios, aplicados com 3 meses após o procedimento cirúrgico final. Um conjunto diferente de escalas avaliou a aparência do rosto (simetria, contorno, textura da pele), qualidade de vida (satisfação com o resultado, sofrimento psicossocial, função psicológica e função social) e efeitos adversos. Exemplos de perguntas são: “Quão satisfeito ou insatisfeito você está com a aparência do seu rosto?"; "Você evita amigos e/ou familiares por causa da aparência do seu rosto?"; "Quão satisfeito ou insatisfeito você está com a simetria do seu rosto?"; "Quão satisfeito ou insatisfeito você está com a aparência do seu rosto no espelho?"; "Você apresenta sensibilidade (por exemplo, quando a área operada é tocada)?"; "Você apresenta dor no local operado?"; "Você tem dificuldades com certos movimentos faciais (por exemplo, sorrir, assoviar, beber)?"

As respostas foram classificadas em escala psicométrica Likert e o resultado final foi convertido em escala numérica de 0 a 100.

Análise Estatística

Os dados foram descritos quanto à natureza e distribuição. As variáveis ​​não paramétricas foram descritas por mediana e intervalo interquartil (IIQ), enquanto as variáveis ​​paramétricas foram descritas por média e DP. Os percentuais de frequência apresentaram variáveis ​​nominais ou dicotômicas.

Os dados foram analisados através do software JASP 0.18.3 (JASP Team, 2024). As variáveis do questionário FACE-Q (qualidade de vida, aparência e efeitos adversos) foram comparados entre os grupos de tempo de reconstrução, presença/ausência de necrose parcial e os tempos cirúrgicos necessários para reconstrução total da face. A simetria da distribuição das variáveis foi avaliada através do teste de Shapiro-Wilk (Field, 2013), no qual valores significativos indicam desvio da normalidade (p < 0,05). A partir disso, utilizou-se do teste de Kruskal-Wallis (McKight & Najab, 2010; Kruskal & Wallis, 1954), com post hoc de Dunn (Dinno, 2015; Dunn, 1954) com ajuste de Holm (Chen, Feng & Yi, 2017), para investigar as comparações pareadas entre os grupos. Além disso, utilizou-se da análise de correlação linear através do coeficiente (⍴) de Spearman (Schmid & Schmidt, 2007), para investigar as correlações entre os escores de qualidade de vida, aparência e efeitos adversos.


Resultado

Foram identificados 35 pacientes operados no Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Ipiranga do Estado de São Paulo, no período de abril de 2023 a julho de de 2023, dos quais 20 (57,14%) responderam aos questionários. Dos outros 15 (42,85%) pacientes excluídos do estudo, 1 (2,85%) faleceu, 3 (8,57%) não conseguiram responder ao questionário por comprometimento neurocognitivo, 5 (14,2%) não completaram a reconstrução e 6 (17,1%) se recusaram a participar, não sendo incluídos no estudo.

A idade mediana dos participantes foi de 67,6 anos (IIQ 60.5–74.2 anos). Desses pacientes, 11 eram homens ( 55 %) e 9 eram mulheres (45 %). A mediana de comorbidades apresentadas pelos pacientes foi 3 (IIQ 2–4 comorbidades), sendo as principais hipertensão arterial sistêmica 12 (60%), tabagismo 10 (50%) e diabetes 6 (30%). O tipo histológico primário foi o carcinoma basocelular, representando 80 % dos casos, seguido do carcinoma espinocelular 10% e do carcinoma basocelular 5%.

As principais técnicas para reconstrução de defeitos na face utilizadas foram a reconstrução com retalho local 9 (45 %), enxerto de pele total 11 (55%). Mais da metade dos pacientes 18 (90%) completaram a reconstrução com apenas 1 procedimento, enquanto 10% necessitaram de 2 operações. O tempo médio para completar a reconstrução foi de 3 meses (IQR 1–4 meses). Nenhum (0%) paciente apresentou complicações relacionadas à reconstrução necessitando de reoperação. Na utilização de retalhos locais foram identificados 1 casos de necrose parcial (5%), e nenhum caso de retração cicatricial ou infecção. Na utilização de enxerto de pele total foram identificados 2 casos de necrose parcial (10%), uma retração cicatricial e nenhum caso de infecção. Em contrapartida, na área doadora nenhum caso necessitou de novo procedimento devido ao mau resultado cosmético da cicatriz .

A avaliação dos resultados utilizando o questionário FACE-Q demonstrou uma alta satisfação dos pacientes com a reconstrução de defeitos faciais, tanto com retalhos locais 9 (45%) quanto com enxertos de pele total 11 (55%). A comparação entre esses dois tipos de reconstrução mostrou que ambos os métodos resultaram em níveis elevados de satisfação entre os pacientes.

Foram realizados testes não paramétricos para análise dos dados. O teste de Kruskal-Wallis apontou que a qualidade de vida foi maior para pacientes com reconstrução em um só tempo cirúrgico = 1 (z= -2,292, WI-WJ= 10,00, p = 0,022), enquanto pessoas com complicações locais (necrose parcial) apresentaram qualidade de vida inferior quando comparadas a pessoas sem complicações (z= 2,407, WI-WJ= 8,824, p = 0,016). Já pessoas que tiveram reconstrução completa em menos de 2 meses apresentaram maior qualidade de vida que pessoas com tempo de reconstrução maior a dois meses (z= -2,728, WI-WJ= 8,500, p = 0,013).

Para aparência, pessoas com reconstrução em tempo cirúrgico único = 1 apresentaram resultados maiores quando comparadas a pessoas que precisaram de mais de um tempo cirúrgico para completar a reconstrução = 2 (z= 2,031, WI-WJ= 8,889, p = 0,042). Já pessoas com tempo de reconstrução inferior a dois meses apresentaram níveis de aparência maiores quando comparados a pessoas com mais de dois meses (z= 2,629, WI-WJ= 8,217, p = 0,017) de tempo de reconstrução.
Por fim, os escores de efeitos adversos foram maiores para pessoas com tempo cirúrgico único = 1 quando comparadas a pessoas com mais de um tempo cirúrgico = 2 (z= -2,402, WI-WJ= -10,000, p = 0,016) para completar a reconstrução.

O domínio aparência teve mediana de 98.4 (IQR 92.1–100.0), enquanto para o domínio de qualidade de vida , o escore 97 (IIQ 87.8–99.5). Em relação ao domínio de efeitos adversos pelo FACE-Q 4.2 ( IQR 0.0–8.3).

Discussão

Este estudo apresenta resultados em curto prazo de pacientes submetidos à reconstrução facial oncológica com retalhos locais e enxertos de pele total. A satisfação dos pacientes com estas técnicas é verificada em termos de aparência, qualidade de vida e função, sem prejuízo à área doadora.

Nosso processo utilizou metodologia semelhante à de outros estudos que utilizaram o FACE-Q 5,6. A proporção de % de respostas aos questionários foi considerada elevada. É fundamental destacar a realidade do sistema público de saúde do Brasil, no qual o presente estudo foi realizado. 95,9% dos pacientes não concluíram o ensino superior e 75,5% ganham até 2 salários mínimos (705,28 US$). Assim como os aspectos socioeconômicos afetam diretamente o tratamento do câncer, é possível que as expectativas desses pacientes em relação à reconstrução também sejam modificadas, favorecendo a avaliação positiva dos resultados.

Conclusão

Este estudo indica que tanto os retalhos locais quanto os enxertos de pele total são opções viáveis para a reconstrução de defeitos faciais após a ressecção de CPNM. Ambas as técnicas proporcionam bons resultados estéticos, qualidade de vida e funcionalidade, além de causarem efeitos leves na área doadora. É importante considerar o tempo total de reconstrução como um fator que afeta a qualidade de vida dos pacientes durante o planejamento do tratamento. Isso também ressalta a necessidade de identificar objetivamente os fatores que podem influenciar esse planejamento.


Referências



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Penteado Figueiredo V, Costa Lobato R, Buelvas Bustillo A, Pereira Lopes C, Mamoru Carneiro R, De Freitas Busnardo F, Gemperli R. Tradução, adaptação e validação linguística do FACE-Q Câncer de Cabeça e Pescoço para o português do Brasil. Rev. Bras. Cir. Plást. 37 (03). DOI: 10.5935/2177-1235.2022RBCP.591-pt. Pub Jul-Sep 2022

Megan E Shelton, Adewole S Adamson. Review and Update on Evidence-Based Surgical Treatment Recommendations for Nonmelanoma Skin Cancer. Dermatol Clin. 2019 Oct;37(4):425-433. doi: 10.1016/j.det.2019.05.002.

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Vaidya TS, Mori S, Khoshab N, Dusza SW, Bander T, Matros E, Rossi AM, Nehal KS, Lee EH. Patient-reported Aesthetic Satisfaction following Facial Skin Cancer Surgery Using the FACE-Q Skin Cancer Module. Plast Reconstr Surg Glob Open. 2019 Sep 30;7(9):e2423.doi: 10.1097/GOX.0000000000002423.

Toral S. Vaidya, Shoko Mori, Stephen W. Dusza, Anthony M. Rossi, Kishwer S. Nehal1, Erica H. Lee. Appearance‐related psychosocial distress following facial skin cancer surgery using the FACE‐Q Skin Cancer. © Springer-Verlag GmbH Germany, part of Springer Nature 2019, 13 July 2019. DOI: 10.1007/s00403-019-01957-2

Palavras Chave

Qualidade de vida; TUMOR DE PELE; reconstrução

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

SERVICOS INTEGRADOS DE CIRURGIA PLASTICA HOSPITAL IPIRANGA - São Paulo - Brasil

Autores

MELISSA NICOLE MONTANO ROJAS, LUIZ EDUARDO FELIPE ABLA, JOSE OCTAVIO GONCALVES DE FREITAS