60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

ANALISE DAS FRATURAS PANFACIAIS NO HOSPITAL UNIVERSITARIO PUC-CAMPINAS

Resumo

Introdução: O trauma é uma das principais causas de morbi-mortalidade global, com aproximadamente 1,3 milhões de óbitos ao ano são ocasionados por acidentes de trânsito e até 1,25 milhão devido a violência interpessoal, sendo que traumas craniofaciais podem representar até 50% desse total.1 A região craniocefálica é particularmente vulnerável devido à sua exposição e pouca proteção. As principais causas de traumatismo facial incluem agressões físicas e acidentes de trânsito, variando conforme fatores socioeconômicos e culturais.2, 3, 4 Fraturas panfaciais são complexas, envolvendo múltiplos segmentos da face e apresentando desafios significativos para os cirurgiões.8, 9, 10 Objetivo: O estudo apresenta uma análise retrospectiva dos traumas panfaciais tratados em no Hospital Universitário PUC-Campinas e comparar com dados atuais da literatura. Método: Estudo retrospectivo utilizando dados de um protocolo digital específico para casos de traumas de face agudos atendidos pelo serviço de Cirurgia Plástica da PUC-Campinas. Dados coletados incluem informações demográficas, mecanismo e etiologia do trauma, e detalhes do tratamento e complicações. O protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética Médica do Hospital Universitário PUC-Campinas. Resultados: Foram identificadas 31 fraturas panfaciais, com predominância em pacientes do gênero masculino (26 casos) e nenhuma ocorrência infantil. Os principais mecanismos de trauma foram acidentes de moto (14), agressões físicas (3), acidentes automobilísticos (6), quedas de bicicleta (2), quedas da própria altura (3) e quedas de altura (3). O tratamento cirúrgico foi realizado em 30 pacientes, utilizando a técnica top-bottom. Intercorrências imediatas incluíram diplopia pós-operatória, fístula maxilar-palato, deiscência de ferida operatória, desalinhamentos de placa, anosmia e lagoftalmo. Conclusão: Os dados coletados neste estudo retrospectivo estão de acordo com os atuais dados da literatura, exceto pela preferência em utilizar a técnica top-bottom no tratamento cirúrgico das fraturas e também por apresentar taxas de intercorrências imediatas abaixo das encontradas na literatura.

Introdução

O trauma consiste em uma das principais causas de morbi/mortalidade na população contemporânea. De acordo dados mais recentes da World Health Organization de 2018, até 1,3 milhões de óbitos ao ano são ocasionados por acidentes de trânsito e até 1,25 milhão devido a violência interpessoal. 1 Desse total, os traumas envolvendo a cabeça e face, podem representar até 50%. Segundo Abreu, RAM et al., 2009 a região crânio-cefálica é mais acometida devido sua grande exposição e pouca proteção, estando mais vulnerável aos acidentes. 2, 3, 4

As principais causas do traumatismo facial são a agressão física e acidentes de trânsito, podendo variar de acordo com diversos fatores, como localidade, nível socioeconômico, gênero, idade e cultura da região estudada. De acordo com estudos brasileiros de Moura, MTFL et al. 2016 e de Zamboni, RA et al. 2017, a agressão interpessoal predomina, já nos estudos internacionais de Khallaf, M. et al. 2019 e de Gonzales, E. et al, 2015, são os acidentes de trânsito.2, 5, 6, 7

As fraturas panfaciais ocorrem quando há uma alta força de energia no trauma, atingindo a região crânio-cefálica.8 Sua definição ainda gera controvérsias, porém a mais atual e utilizada se baseia no acometimento de pelo menos três dos quatro segmentos da face (frontal, face média superior, face média inferior e mandíbula).9 Essas fraturas são verdadeiros desafios para os cirurgiões, visto que são complexas e de difícil correção devido à instabilidade das estruturas envolvidas.10

Conforme visto nos artigos de Yoon, JH. et al., 2022 e de Ali, K. et al., 2017 muitos cirurgiões tentaram descrever a melhor forma para correção, porém ainda é uma tarefa difícil e que gera debates. As duas principais maneiras são a bottom-top e top-bottom. A técnica top-bottom é realizada na sequência crânio-mandibula, seguindo a ordem: reconstrução do seguimento fronte, órbita e paredes mediais orbitais, complexo zigomático malar, maxila e por último a mandíbula. Já na técnica bottom-top a sequência é invertida.11, 12 Segundo os estudos, as intercorrências imediatas independem da técnica utilizada e estão mais relacionadas com a complexidade, número de ossos fraturados e quantidade de tecido mole acometido. As mais comuns vistas são enoftalmia, telecanto traumático, maloclusão, limitação na abertura oral, parestesia, lesão de nervo facial, infecção, deformidade em dish-face.13

Para melhor planejamento e segurança cirúrgica, o uso de tecnologias em imagens, como a reconstrução 3D da tomografia computadorizada, é utilizada, de acordo com Bell, 2019.14

Além da complexidade do seu tratamento e seguimento, esse tipo de trauma pode trazer consequências psicológicas e afetar a dinâmica familiar do paciente.15 Foi vista a presença de transtorno de estresse pós-traumático, assim como depressão, baixa autoestima e isolamento social, decorrentes tanto do estresse da gravidade do trauma, quanto por alterações físicas na aparência.16 Em relação aos impactos familiares, pode ser gerado um estresse estrutural, a depender do cargo que o paciente ocupa na sua família e também impactos financeiros importantes.17, 18

Objetivo

O objetivo deste trabalho é apresentar os dados retrospectivos dos traumas panfaciais tratados no Hospital Universitário da PUC-Campinas e comparar com atuais dados da literatura.

Método

Trata-se de um estudo retrospectivo utilizando dados coletados de um protocolo digital específico para todos os casos de traumas de face agudos atendidos pelo serviço de Cirurgia Plástica da PUC-Campinas. Este protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética Médica do Hospital Universitário PUC-Campinas sob o número 009/08. Nele são adicionados os seguintes dados: data do trauma, nome do paciente, idade, gênero, etnia, profissão, mecanismo e etiologia do trauma, fatores associados ao trauma, como uso de bebido alcoólica e/ou drogas, fraturas de face associadas, lesões associadas, localização da fratura, tipo de tratamento e presença de complicações.

Todos os casos foram conduzidos com atendimento inicial baseado no ATLS, exame físico específico da face e realização de tomografia computadorizada da face e crânio sem contraste com reconstrução 3D. Nos casos dos traumas panfaciais são ainda realizadas avaliações oftalmológicas de motilidade ocular extrínseca, pressão intra ocular, acuidade visual, fundo de olho, biomicroscopia. Também é realizada avaliação neurológica a depender de achados de imagem e/ou sintomas referidos.

Os pacientes com esse tipo de traumatismo foram submetidos a tratamento cirúrgico estruturado, segundo a técnica top-bottom, a qual pode ser descrita da seguinte forma e de acordo com as necessidades individuais de cada paciente: redução das fraturas do osso frontal e fixação com placas de titânio; redução das fraturas de assoalho orbitário, reposicionamento ósseo com uso de telas ou enxertos para suportar o assoalho; redução das fraturas de paredes orbitárias com placas de titânio; redução das fraturas zigomáticas e fixação com mini-placas; redução e fixação das fraturas de maxila, iniciando pelo complexo nasomaxilar e após o complexo Le Fort; por último, redução com alinhamento da oclusão das fraturas de mandíbula, incialmente pelo ângulo e corpo e após, sínfise e para-sínfise. O follow-up é realizado semanalmente no primeiro mês e depois mensalmente por 6 meses, sendo realizados exames físicos da face.

Resultado

Foi realizado o levantamento em protocolo digital, associando as fraturas conforme definição, sendo encontradas 31 fraturas panfaciais, dessas, 26 ocorreram em pacientes do gênero masculino e 5 no feminino. Nenhum caso infantil foi relatado.

Em relação ao mecanismo de trauma, 14 foram acidentes motociclísticos, 3 vítimas de agressão física, 6 acidentes automobilísticos, 2 acidentes biciclísticos, 3 quedas da própria altura e 3 quedas de altura.

O tratamento cirúrgico foi instituído em 30 pacientes, no período máximo de 10 dias após o dia do trauma, utilizando a técnica top-bottom em todos os casos.

Quando buscamos as intercorrências imediatas, foram encontradas 7, assim descritas: 1 caso de diplopia pós-operatória, 1 fístula maxilar-palato, 1 deiscência de ferida operatória, 2 desalinhamentos de placa após fixação, 1 caso de anosmia e 1 caso de lagoftalmo. Todos os pacientes foram submetidos a reabordagem, com resultado satisfatório e sem sequelas permanentes.

Discussão

O tratamento das fraturas panfaciais, conforme demonstrado neste estudo retrospectivo, destaca a complexidade e os desafios associados a essas lesões. A predominância de fraturas em pacientes do gênero masculino está alinhada com a literatura existente, que frequentemente associa maior incidência de traumas faciais a atividades de maior risco e comportamentos mais propensos a acidentes entre homens.2, 5

Os dados deste estudo reforçam a prevalência de agressões físicas e acidentes de trânsito como principais causas de fraturas panfaciais, assim como visto nos últimos dados de 2018 da WHO.1 Estes achados são consistentes com estudos nacionais, como exemplo o de Moura, MTFL et al. 2016 e de Zamboni, RA et al. 2017 e internacionais, como de Khallaf, M. et al. 2019 e de Gonzales, E. et al, 2015, onde se observa variação nas causas predominantes de acordo com fatores socioeconômicos e culturais. Em regiões com maior índice de violência, as agressões interpessoais são a principal causa, enquanto em áreas com tráfego intenso e menos controle de segurança viária, os acidentes de trânsito se destacam.2, 3, 5, 6, 7

A escolha pela técnica top-bottom em todos os casos cirúrgicos analisados neste estudo reflete uma preferência por essa abordagem pelos cirurgiões plásticos do Hospital Universitário da PUC-Campinas. A técnica top-bottom é frequentemente escolhida devido à possibilidade de estabilizar primeiro a base do crânio e a porção superior da face, fornecendo uma estrutura estável para a fixação subsequente das fraturas do terço médio e inferior da face.10, 11, 12 No entanto, a revisão sistemática realizada por Ramakrishnan K. et al., 2021, sugere que a escolha entre as técnicas top-bottom e bottom-top deve ser adaptada a cada caso específico, levando em consideração a extensão e a localização das fraturas.13

Apesar da abordagem cirúrgica padronizada, foram observadas intercorrências imediatas em alguns pacientes, sendo elas diplopia pós-operatória, fístula maxilar-palatina, deiscência de ferida operatória, desalinhamentos de placa após fixação, anosmia e lagoftalmo. Um paciente apresentou amaurose no exame físico inicial de atendimento, demonstrando a possibilidade de lesão de nervo óptico, que se manteve após o pós operatorio de correção das fraturas, ressaltando assim, a importância da avaliação oftalmológica no pre-operatóriapara prevenção de sequelas permanentes. Apenas 1 único paciente não foi submetido ao tratamento cirúrgico, pois apesar de ter realizado avaliação cardiológica pré operatória, ele apresentou uma parada cardiorrespiratória após a primeira redução de fratura (fronte), sendo optado por encerrar o procedimento e manter tratamento conservador das demais fraturas presentes.

Essas intercorrências ressaltam os desafios inerentes ao tratamento de fraturas panfaciais, assim como a complexidade dos pacientes por se tratar de uma trauma de alto impacto físico, psicológico e social, importância de uma abordagem inicial estruturada, multidisciplinar e individualizada para minimizar riscos e otimizar os resultados.

O uso de um protocolo digital específico para o registro de dados clínicos de traumas faciais contribuiu significativamente para a organização e a análise sistemática dos casos. A coleta detalhada de informações, como idade, gênero, mecanismo do trauma e complicações, facilita a avaliação retrospectiva e a comparação com dados da literatura. Além disso, a utilização de tomografia computadorizada com reconstrução 3D para avaliação das fraturas é uma prática recomendada pelos estudos de Bell, RB., 2019, proporcionando uma visão detalhada da extensão e localização das lesões, essencial para o planejamento cirúrgico. Sendo assim, os resultados reafirmam a importância de uma abordagem multidisciplinar e bem estruturada para o manejo das fraturas panfaciais.14

Comparando os resultados deste estudo com a literatura, observa-se uma consistência nos achados referentes à predominância de traumas em homens jovens e as principais causas de fraturas panfaciais.2, 3, 7 No entanto, a taxa relativamente baixa de intercorrências imediatas sugere um nível elevado de eficácia no manejo dos casos tratados no Hospital Universitário PUC-Campinas.8, 9 Esses resultados positivos podem ser atribuídos à experiência dos cirurgiões, ao uso de técnicas cirúrgicas adequadas e à aplicação rigorosa de protocolos de tratamento e avaliação.

Conclusão

Os dados coletados neste estudo retrospectivo estão de acordo com os atuais dados da literatura, exceto pela preferência em utilizar a técnica top-bottom no tratamento cirúrgico das fraturas e por apresentar taxas de intercorrências imediatas abaixo das encontradas na literatura.

Referências

World Health Organization. Global status report on road safety 2018. [Acesso em 23 de maio de 2024]. Disponível em: Global status report on road safety 2018 (who.int)
Moura MTFL, Daltro RM e Almeida TF. Traumas faciais: uma revisão sistemática da literatura. RFO UPF [online]. 2016, vol.21, n.3, pp. 331-337
Macedo, JLS et al. Perfil epidemiológico do trauma de face dos pacientes atendidos no pronto socorro de um hospital público. Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões [online]. 2008, v. 35, n. 1.
Abreu RAM, Moreira BC, Silveira ACL, Faria JCM. Estudo prospectivo dos traumas orbitários e suas repercussões oftalmológicas no hospital de referência regional PUC-Campinas. Rev Bras Cir Craniomaxilofac, 2009; 12(2): 60-6

REFERENCIAS SEGUEM EM ANEXO EM FOTO.

Palavras Chave

fraturas panfaciais; cirurgia craniomaxilofacial; fraturas complexas da face.

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

HOSPITAL UNIVERSITARIO PUC CAMPINAS - São Paulo - Brasil

Autores

HELENA GOULART GOMES MONTEIRO, ROGERIO ALEXANDRE MODESTO ABREU, ANDREZA CRISTINA CAMACHO VARONI, DANIELLA NUNES CAMARGO, VICTORIA RUSSOWSKY ACCIOLY, GILSON LUIS DUZ