60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

RECONSTRUÇAO NASAL POS RINECTOMIA PARCIAL ESQUERDA POR MELANOMA: CIRURGIA EM DOIS TEMPOS.

Resumo

Este relato de caso trata da epidemiologia, etiologia, diagnóstico e opções de tratamento do melanoma nasal, com ênfase na reconstrução nasal pós-ressecção cirúrgica. Discute-se as opções de tratamento cirúrgico, incluindo técnicas de reconstrução, bem como as considerações estéticas e funcionais envolvidas na escolha da abordagem de reconstrução ideal. Além disso, é abordada a importância da participação de equipe multidisciplinar nesses casos complexos, bem como aguardar o momento ideal para reconstrução sem prejuízo oncológico e funcional ao paciente.

Introdução

O nariz é uma estrutura anatômica complexa, tridimensional, única e com grande importancia funcional e estética para o indivíduo. Sua proeminência na face favorece à exposição solar e, consequentemente, apresenta elevada incidência de câncer de pele. As neoplasias malignas mais comuns nesse sítio são compostas pelos carcinomas basocelulares (CBC), seguido de carcinoma escamocelular (CEC), sendo ambos incluidos em um mesmo subgrupo - câncer de pele não melanomas (CPNM) e um outro subgrupo, menos comum, constituindo cerca de 5% do total das neoplasias cutâneas tem-se o melanoma cutâneo maligno (MCM). Embora corresponda a uma menor incidência o MCM alta agressividade e letalidade, e vem aumentando sua incidência anualmente e assim, sua grande importância no nosso meio, sendo responsável pela vasta maioria dós obitos por câncer de pele em todo o mundo1.
As demandas por reconstrução nasal, devido às lesões malignas, estão em ascensão e na maioria das vezes apresentam técnicas cirúrgicas desafiadoras, principalmente no terço distal do nariz, onde a pele é mais espessa e aderida à cartilagem subjacente, e há maiores riscos de distorção das margens nasais2. É importante observar que lesões mais profundas podem estar comprometendo o arcabouço cartilaginoso e a mucosa nasal, necessitando de uma reconstrução ainda mais complexa, visando manter a funcionalidade do nariz3 .
Dada a agressividade do MCM o diagnóstico precoce é essencial para o tratamento bem-sucedido e com menor morbimortalidade, mas muitas vezes isso ocorre em em estágios mais avançados, o que apresenta desafios significativos para a manejo clínico e cirúrgico. O tratamento do melanoma nasal deve ser multidisciplinar, envolvendo dermatologista, cirurgião de cabeça e pescoço, oncologista clinico e cirurgiões plásticos. A reconstrução nasal após a ressecção cirúrgica é desafiadora devido à complexidade anatômica da região e à necessidade de preservar a função respiratória e estética. Técnicas como enxertos cutâneos, retalhos locais e retalhos microcirúrgicos têm sido utilizadas com sucesso para reconstruir defeitos resultantes da excisão do melanoma nasal. No entanto, a seleção da técnica de reconstrução deve levar em consideração fatores como estágio da doença, extensão do tumor, disponibilidade de tecido adjacente e condições clinicas individuais do paciente, como status nutricional, idade e comorbidades. A reconstrução nasal é uma etapa crucial no manejo desses pacientes, visando não apenas restaurar a função respiratória e estética, mas também preservar a qualidade de vida4.

Objetivo

RELATAR UM CASO DE RECONSTRUÇÃO NASAL PÓS RINECTOMIA PARCIAL POR MELANOMA NASAL

Método

Paciente P.M.S, feminina, 80 anos, natural e procedente de Sao paulo-SP - figura 1. Refere surgimento de lesão enegrecida em ponta nasal há 1 ano, inicialmente macular, hipercromica e de aproximadamente 0,2 cm. Notou crescimento progressivo nos ultimos 2 meses, tornando de bordos irregulares e mudança da coloração. Procurou dermatologista em serviço externo, sendo realizado biópsia incisional e com diagnóstico de melanoma in situ. Procura serviço de cirurgia plástica do Hospital do Servidor Público Estadual-HSPE devido ao diagnóstico para condução do caso. Ao exame de entrada apresentava lesão de 2,0 cm em ponta e asa nasal esquerda, bordos irregulares, centro descamativo e em cicatrização (local da biópsia incisional) com telagectasias de permeio, sem linfonomegalia clinicamente visiveis ou palpáveis. Foram, entao, solicitados exames de estadiamento, incluindo tomografia de crânio, face, pescoço e tórax, exames pre operatórios, avaliação da equipe de cirurgia de cabeça e pescoço (CCP) e dermatologia do HSPE e antesista, bem como agendamento cirúrgico de biópsia excisional para correto estadiamento e conduta. Apresentava como antecedente cirurgico apendicectomia laparotômica, há 50 anos, histerectomia total há 30 anos. Nega tabagismo ou etilismo, sem comorbidades ou uso de medicações de uso continuo. Relato de exposição solar continua por mais de 30 anos, sem protetor solar ou outras formas de proteção. Em 20/06/23 foi realizada biópsia excisional pela equipe de CCP e após 3 semanas, resultado de AP confirmou tratar-se de um melanoma, com as seguintes características melanoma invasor do tipo desmoplásico, nivel V de Clark, breslow de 4,1 mm, sem detecção de mitoses (0 mitoses por campo), sem ulceração e sem infiltração angiolinfática, sendo estadiada pelo TNM (figura 2) como pT4a. Dessa maneira, indicado ampliação de margem de 2,0 cm, conforme o breslow (tabela 1), e biópsia de linfonodo sentinela nivel 1b, procedimento realizado pela também pela equipe de cirurgia de cabeça e pescoço em conjunto com a equipe de cirurgia plástica em 27/07/23, optado por deixar leito cruento com curativo local (rayon + nebacetin), aguardando resultado do anatomopatológico (AP), com seguimento semanal, sem nenhum prejuízo do ponto de visto funcional/respiratório para a mesma (figuras 3 e 4). Detectado 1 linfonodo da cadeia 1b, também livre de acometimento neoplásico.

Resultado

Em 25/08/23, realizada reconstrução pela equipe de cirurgia plástica HSPE, com a confecção de um retalho nasogeniano em rotação de pedículo superior para reconstrução de região de asa e dorso nasal e em dobradiça decorticado distalmente para confecção do forro nasal e enxerto de cartilagem auricular em bloco de região de tragos, incisura tragal e concha para região de cartilagem triangular inferior, reconstruindo a parte estrutural da asa nasal- figura 5. Paciente de alto no 1º pos operatório, sem queixas- figura 5, retornou para seguimento em 1 semana , 2 semanas, 1 mes, 3 meses e 6 meses (figura 6). Apresenta-se, no momento, queixas funcionais, sem queixas respiratórias, matendo suficiência de valvula externa, discreta retação em asa nasal, porém muito satisfeita com resultado estético. Mantém seguimento com dermatologia, cirurgia plástica, cirurgia de cabeça e pescoço e oncologia clínica, nao indicado adjuvância e sem necessidade, até o momento, de novas intervenções cirúrgicas.

Discussão

O melanoma é originário dos melanócitos e corresponde à forma mais grave dos tumores cutâneos, sendo responsável por cerca de 90% da mortalidade entre os câncer de pele, além de representar cerca de 1,7% de todos os tumores malignos. Estudos recentes mostram um aumento da incidência (por 100.000 habitantes) do melanoma em alguns países: Europa com 10-25 novos casos; EUA com 20-30 casos e Austrália com 50-60 casos. Assim como na América do Sul, o Brasil possui incidência de 3,9 a 4 casos novos por 100.000 habitantes e, aproximadamente, 1.500 mortes relacionadas. Nos últimos anos, foi registrado um aumento dramático da incidência em indivíduos com mais de 60 anos, especialmente os homens5.
Em relação a distribuição por sexo, os homens são mais acometidos pelo MCM, com risco de 0,42% de adquirir a patologia, com 3,8/100.000 casos por habitantes. Já as mulheres possuem incidência de 3,0/100.000 casos por habitantes com risco de 0,33%6.
A exposição intensa ou repetida à luz solar é o principal fator de risco relacionado ao melanoma, sendo que a vasta maioria dos melanomas se desenvolve na pele exposta ao sol, principalmente em áreas mais suscetíveis a queimaduras solares. A exposição intermitente e as queimaduras solares na adolescência ou infância foram fortemente associadas a um risco aumentado de melanoma, enquanto a exposição ocupacional não conferiu um risco aumentado7,8.
Os primeiros sinais e sintomas da manifestação de melanomas são a mudança em um nevo já existente ou o surgimento de um nevo de aparência incomum. Existem casos em que o melanoma não surge de nevos, e sim de pele aparentemente sem alterações. Ou seja, a maioria dos melanomas são altamente pigmentados, mas também podem ser amelanóticos. Essa ampla forma de apresentação se configura na prática em uma dificuldade da realização de diagnósticos precoces, sendo este um objeto de amplo estudo, com foco na abordagem metodológica dos melanomas quanto a avaliação clínica e seguimento9.
Para identificar as características de nevos considerados incomuns, que podem corresponder a melanomas, utiliza-se a regra do ABCDE (Assimetria, Bordas, Cor, Diâmetro, Evolução). Nevos que apresentam forma assimétrica, bordas irregulares, diversas cores, diâmetro maior que 5 mm e que estão sofrendo mudança ao longo do tempo, seja em tamanho, cor, formato ou apresentaçao, inicando com prurido e sangramento, merecem atenção especial e devem ser realizada avaliação anatomopatológica.9 Ou seja, toda lesão suspeita clinicamente deve ser submetida à biópsia excisional sempre que possível, com margem de 1-2 mm. Vale salientar que a análise histopatológica com índice de Breslow (tabela 1) é fundamental para estadiamento e definição de ampliação de margens cirúrgicas (tabela 1)10. O estadiamento do melanoma é amplamente utilizado para avaliação prognóstica e para definição de conduta e é atualmente baseado na oitava edição da American Joint Comission on Cancer (AJCC), atualizado em 2017 e válido até 2024. O estadiamento se baseia no tradicional sistema de TNM, onde o T detalha o tumor primário, N detalha o acometimento de linfonodos regionais e o M detalha a doença sistêmica. Assim, com os dados obtidos no TNM, o paciente é enquadrado no estadiamento clínico patológico (pTNM), que de forma mais detalhada concilia a avaliação clínica e histopatológica, obtida com biópsia de lesão e de linfonodos10.
A pesquisa do linfonodo sentinela deve ser oferecida a todos pacientes com melanomas cutâneos pT2 e pT3, independentemente da topografia do tumor primário, desde que não haja doença linfonodal clinicamente detectável e se as condições clínicas do paciente assim o permitirem; Deve ser realizada no mesmo procedimento cirúrgico da ampliação de margens a partir da biópsia do tumor primário. Avaliação complementar por exames de imagem é indicada a todos os pacientes com detecção de doença metastática ao diagnóstico, com tomografia de crânio, tórax, abdome e pelve 10.
Todos os pacientes com diagnóstico de melanoma devem ter acompanhamento dermatológico no mínimo anualmente por toda a vida, sendo a cada 6 meses nos primeiros 5 anos do diagnóstico o mais recomendado. Educar o paciente para o autoexame da pele e linfonodos e seguimento com cirurgião plástico, oncológico ou de cabeça e pescoço responsável pela retirada da lesão10.
Devido a agressividade e alta letalidade do melanoma, torna-se imperativo o seguimento das etapas corretas do diagnostico e estadiamento para propor o melhores tratamento para o paciente. No caso apresentando, mesmo com uma lesão de grande dimensão e com grande desfiguração após a biópsia excisional e ressecção cirurgica, aguardar o resultado do anatomopatológico, com correto estadiamento- seguindo os guidelines atuais-, proporcionou o resultado oncológico adequado, tempo hábil para discussão multidisciplinar incluindo a paciente para propor as melhores propostas de reconstrução, o que acarretou em um excelente resultado estético e funcional, sem prejuízos para a paciente durante o perído interprocedimentos.

Conclusão

O melanoma nasal representa um desafio clínico devido à sua natureza agressiva e localização anatômica complexa. A abordagem terapêutica deve ser individualizada, considerando o estágio da doença, características do paciente e opções de tratamento disponíveis. A reconstrução nasal desempenha um papel fundamental na recuperação funcional e estética dos pacientes submetidos à ressecção cirúrgica do melanoma nasal. Estratégias de reconstrução multidisciplinar são essenciais para alcançar resultados favoráveis e melhorar a qualidade de vida e aumento da sobrevida desses pacientes.

Referências

1. Yildiz K, Gorgulu T, Yesiloglu N, Kelahmetoglu O, Camli MF, Canter HI. Hybrid reconstruction of distal nasal defects. Dermatol Ther. 2021;34(1):e14734
2. Cason RW, Shammas RL, Pyfer BJ, Glener AD, Marcus JR, Cook JL. Cutaneous Reconstruction of the Nasal Distal Third: Alternative Local Flaps for a Complex Region. Plast Reconstr Surg Glob Open. 2021;9(5):e3444.
3. Souza MPS, Pessoa SGP, Muniz VV, Rebelo AD, Holanda EF, Pessoa LMGP. Opções de reconstrução após ressecção de tumor de pele nasal. Rev Bras Cir Plást. 2019;34(Suppl. 3):50-.
4. Lopes J, Rodrigues CMP, Gaspar MM, Reis CP. Melanoma Management: From Epidemiology to Treatment and Latest Advances. Cancers (Basel). 2022 Sep 24;14(19):4652. doi: 10.3390/cancers14194652. PMID: 36230575; PMCID: PMC9562203.
5. Saginala K, Barsouk A, Aluru JS, Rawla P, Barsouk A. Epidemiology of Melanoma. Med Sci (Basel). 2021 Oct 20;9(4):63. doi: 10.3390/medsci9040063. PMID: 34698235; PMCID: PMC8544364.
6. JÓZSEF TÍMÁR; LADÁNYI, A. Molecular Pathology of Skin Melanoma: Epidemiology, Differential Diagnostics, Prognosis and Therapy Prediction. International Journal of Molecular Sciences, v. 23, n. 10, p. 5384–5384, 11 maio 2022.
7. Conforti C, Zalaudek I. Epidemiology and Risk Factors of Melanoma: A Review. Dermatol Pract Concept. 2021 Jul 1;11(Suppl 1):e2021161S. doi: 10.5826/dpc.11S1a161S. PMID: 34447610; PMCID: PMC8366310.
8. Puckett Y, Wilson AM, Farci F, Thevenin C. Melanoma Pathology. 2022 Oct 24. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2024 Jan–. PMID: 29083592.
9. EDDY, K.; CHEN, S. Overcoming Immune Evasion in Melanoma. International Journal of Molecular Sciences, v. 21, n. 23, p. 8984–8984, 26 nov. 2020.
10. National Comprehensive Cancer Network. Melanoma: Cutaneous Version 2.2024. https://www.nccn.org/login?ReturnURL=https://www.nccn.org/professionals/physician_gls/pdf/cutaneous_melanoma.pdf. Accessed june 12, 2024.


Palavras Chave

Neoplasias cutâneas; RECONTRUÇÃO NASAL; retalho nasogeniano

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo- HSPE - São Paulo - Brasil

Autores

EDUARDO MACHADO MARIANO, ANNA LUIZA NUNES DE FREITAS, RAFAELA MIHO YTO, VIVIAN CALVINO LAGARES SCALCO, MARIA MADUREIRA MURTA, GIOVANA GIORDANI