60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

RECONSTRUÇAO DE BRAÇO COM RETALHO MUSCULOCUTANEO DO MUSCULO GRANDE DORSAL – RELATO DE CASO

Resumo

Os sarcomas de partes moles em membros superiores acarretam grandes defeitos que impactam na funcionalidade, estética, produtividade do paciente. É imperativo que reconstruções complexas sejam realizadas com o intuito de restabelecer mobilidade, atividade laboral, melhoria da qualidade de vida.
O retalho musculocutâneo do grande dorsal é uma opção clássica e confiável, rápida com capacidade de cobertura de grandes defeitos e possibilidade de fechamento primário da área doadora o que acarreta bons resultados estéticos e funcionais para os pacientes.
Relatamos um caso de reconstrução de porção anterior do braço após ressecção ampla de sarcoma de partes moles medindo 17 x 13 cm, com necessidade de esvaziamento axilar, utilizando retalho musculocutâneo pediculado do músculo grande dorsal com evolução satisfatória.

Introdução

A abordagem de lesões tumorais acometendo partes moles está inserida na rotina do cirurgião plástico. Dentre os tumores dessa localização, sarcomas são considerados tumores malignos raros, representando menos de 1% dos tumores malignos em adultos (1). Soma-se a isso o fato desses abrangerem uma ampla gama de subtipos de sarcoma, compreendendo mais de 50 subtipos histológicos baseados na linhagem tumoral, dificultando o agrupamento estatístico e estudo das doenças causadas por esses (2).
Sarcomas de partes moles (SPM) tendem a ser pouco sintomáticos, porém podem sofrer crescimento progressivo e atingir grandes dimensões. Atingem qualquer faixa etária e localização, porém são mais frequentes em pacientes acima dos 65 anos e acometendo extremidades em até 75% dos casos (3).
Estima-se que 10% dos pacientes apresentam doença metastática ao diagnóstico, em especial metástases pulmonares (4). A sobrevida esperada em 5 anos é de 80%. O tratamento definitivo gira em torno da ressecção radial com margens negativas. Fatores como subtipo do sarcoma, grau histológico, tamanho da lesão e presença de margens comprometidas também influem na sobrevida (5).
Ao se tratar da reconstrução de membros superiores após exérese de SPM, diversas técnicas podem ser aventadas. Dentre os principais retalhos, pode-se citar como opções: retalho trapézio (6), retalho lateral do braço (7), retalho grande dorsal (8), retalho musculocutâneo transverso do reto-abdominal (9), retalho musculocutâneo vertical do reto abdominal (10), retalho antebraquial (11). Esses retalhos podem ser confeccionados de forma pediculada e/ou livre, de modo individualizado.
Conforme descrito, as técnicas acima são alternativas seguras e aplicáveis para reconstrução de membros superiores após a abordagem cirúrgica dos SPE. Desse modo, são de vital importância nas reconstruções após ressecções oncológicas alargadas, frequentes nesses casos.

Objetivo

Relatar um caso de leiomiossarcoma de braço com reconstrução com retalho do músculo grande dorsal

Método

Relato de caso clínico específico através de consulta de prontuário, documentação de prontuário médico institucional, arquivo fotográfico pessoal e revisão bibliográfica. Para a revisão foram utilizadas bases de dados Lilacs, PubMed, MedLine, Scielo, com revisão de artigos entre 2010 e 2024.

Resultado

Paciente masculino, 63 anos, hipertenso, atendido no ambulatório do serviço de cirurgia plástica devido lesão vegetante friável, aderida a planos profundos em braço direito com crescimento rápido e progressivo em 6 meses medindo 17 x 13 cm (imagem 1). Foi submetido a biopsia, análise histológica evidenciou se tratar de uma neoplasia mesenquimal fusocelular com moderado índice proliferativo e com área focal sugestiva de diferenciação miofibroblástica. A imunohistoquimica apresentou PS-100 negativo, Ki-67 40%, desmina negativo, anti-músculo liso positivo, podoplamin negativo, HMB-45 negativo, CD 34 negativo, AE1/AE3 negativo, o que favorecia se tratar de um leiomiosarcoma.
Realizado exames de estadiamento, com tomografia de tórax evidenciando linfonodomegalia axilar e infraclavicular direita medindo até 14mm. A ressonância magnética de braço direito mostrava uma formação expansiva subcutânea, de contornos lobulados, com sinal heterogêneo e realce pelo meio de contraste paramagnético, em contato com margem superficial do bíceps braquial, medindo cerca de 4,7 x 3,3 x 2,7cm, dois meses depois foi submetido a tomografia de braço direito que mostrava uma lesão expansiva heterogênea com impregnação periférica pelo contraste e centro hipoatenuante, medindo 10,0 x 4,6 x 7,0cm, sem plano de clivagem com a musculatura adjacente
Paciente foi submetido anestesia geral e posicionado em decúbito dorsal horizontal. Para o tratamento linfonododal, apesar da metástase preferencial ser por via vascular venosa, o exame de tomografia mostrava linfonodomegalia axilar, diante disso foi realizado infiltração subdérmico de 2ml de azul patente, aguardado 7 minutos e realizado exploração da axila com ressecção e encaminhamento do linfonodo sentinela para congelação. A ressecção da lesão em braço direito foi realizada seguindo os princípios básicos de cirurgia oncológica com margem de 2cm e encaminhado peça para anatomia patológica (imagem 2). A congelação do linfonodo sentinela se mostrou positiva para neoplasia maligna, procedeu-se com o esvaziamento axilar linfonodal dos níveis I, II e III e reconstrução do defeito do braço no mesmo ato cirúrgico com músculo grande dorsal pediculado.
A ilha cutânea do retalho foi delimitada em sentido vertical em função da melhor forma e posicionamento para cobertura do defeito de 17 x 13 cm (imagem 3). Realizado incisão da pele e isolamento do músculo grande dorsal inicialmente pela sua borda lateral com bisturi harmônico, e sua liberação em sentindo cranial, com identificação e preservação do pedículo vascular. Realizada incisão da pele do oco axilar com descolamento cutâneo da região dorsal e face anterior do braço para posicionamento do pedículo do retalho. O retalho foi então transposto para o sítio do braço sem tensão. Prosseguido com posicionamento de dreno de sucção 4.8mm e fechamento da área doadora em três planos, com pontos separados de vicryl 2 nos planos profundos, pontos simples invertidos com caprofyl 3-0 subdérmicos e síntese cutânea com nylon 3-0 com pontos em donatti.
Realizado fixação do músculo grande dorsal no leito do braço (porção proximal e distal da cabeça curta do bíceps braquial e cabeça lateral do tríceps braquial) com vicryl 3-0 com pontos separados, seguido por síntese do subcutâneo, pele e, por fim, curativo ao término do procedimento (imagem 4).
O paciente evoluiu sem intercorrências, o retalho não apresentou nenhum sinal de sofrimento ou isquemia, com boa evolução ao longo de um mês de pós operatório (imagem 5).

Discussão

Sarcoma de partes moles (SPM) é um tumor mesenquimal maligno raro, que geralmente acomete extremidades. Antigamente o tratamento cirúrgico se restringia a amputação do membro envolvido (12, 13, 14, 15). Atualmente o SPM possui uma sobrevida em 5 anos de 80%. O tratamento definitivo gira em torno da ressecção radial com margens negativas o que garante menor morbidade do que a amputação, entretanto a extensão da ressecção para atingir margens livres, pode causar uma perda funcional limitante (16). A preservação do membro passou então a ser indicada para (a) tumores ressecáveis com margem de segurança; (b) elevada possibilidade de sobrevida que justifique uma cirurgia complexa; (c) recusa de amputação pelo paciente; (d) pacientes paliativos com doença no membro que podem se beneficiar do aumento na qualidade de vida (17).
A avaliação e escolha da técnica reconstrutiva deve ser individualizada devendo levar em consideração diversos fatores, dentre eles: idade, comorbidades prévias, expectativa de vida, composição corporal da paciente e grau de profundidade de invasão da lesão a ser abordada.
A correção das deformidades geradas varia baseado na necessidade de cobertura, de maneira crescente em porte cirúrgico e grau de complexidade para execução. Defeitos menores podem ser eventualmente fechados primariamente, à medida que defeitos extensos podem requerer a expansão tecidual, enxertos de pele, retalhos pediculados fascio ou musculocutâneos ou a confecção de retalhos livres microcirúrgicos para o seu fechamento.
O retalho do músculo grande dorsal geralmente é escolhido para a reconstrução funcional e cobertura de partes moles no membro superior. Trate-se de um retalho Mathes e Nahai do tipo V, com um pedículo dominante pela artéria toracodorsal e suprimento sanguíneo secundário pelos perfurantes intercostais posteriores. Com origem nos processos espinhosos de T7 a T12, L1 a L5 e sacro e fáscia toracolombar, parte inferior da escápula e terço posterior da crista ilíaca e 9ª a 12ª costela. Se insere no sulco intertubercular do úmero. Seu pedículo possui um diâmetro médio entre 6,5 e 12cm. Pode ser utilizado de forma pediculada ou como retalho microcirúrgico. É um retalho de dissecção rápida, fácil, segura. A ilha de pele pode ter orientação vertical, oblíqua ou transversal, sendo o retalho com maior ilha de pele possível do corpo humano, podendo medir até 35cm de comprimento por 20cm de largura e espessura média entre 1 e 5 cm (14).
Complicações cirúrgicas incluem o risco de infecção, lesão neurovascular, desvascularização do retalho, duração cirúrgica (13, 14). No caso apresentado, nós realizamos uma cirurgia de preservação do membro superior com reconstrução com grande dorsal, uma vez que é um retalho facilmente rotacionado, capaz de cobrir grandes defeitos e possui baixa morbidade na área doadora.
A abordagem oncológica multidisciplinar é o sucesso no manejo dos pacientes com sarcoma de partes moles.

Conclusão

A cirurgia de preservação do membro seguida por reconstrução de partes moles com retalho grande dorsal é uma técnica ainda pouco descrita na literatura. No caso apresentado foi uma opção que permitiu completa cobertura de defeito de grande extensão do braço pós ressecção tumoral e fechamento primário da área doadora, gerando mínima morbidade ao paciente, sem complicações cirúrgicas como infecção, hematoma, isquemia do retalho.

Referências

1. Kandel R, Coakley N, Werier J, Engel J, Ghert M, Verma S. Surgical margins and handling of soft-tissue sarcoma in extremities: a clinical practice guideline. Curr Oncol. 2013;20(3):e247-54.
2. Fletcher CDM, Unni KK, Mertens F, editors. Pathology and genetics of tumors of soft tissue and bone. 4th ed. Lyon: IARC Press; 2013.
3. Roeder F, Krempien R. Intraoperative radiation therapy (IORT) in soft-tissue sarcoma. Radiat Oncol. 2017;12(1):20.
4. Forscher C, Mita M, Figlin R. Targeted therapy for sarcomas. Biologics. 2014;8:91-105.
5. Callegaro D, Miceli R, Mariani L, Raut CP, Gronchi A. Soft tissue sarcoma nomograms and their incorporation into practice. Cancer. 2017;123(15):2802-20.
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7. Cunha MS, Alves CPS, Ramos R, Agra IM, Menezes JV. Versatilidade do Retalho Lateral do Braço Microcirúrgico em Reconstruções Complexas. Rev. Bras. Cir. Plást.2007;22(4):213-218
8. Orletti et al. Rev. Bras. Cir. Plást. 37 (4) Oct-Dec 2022 https://doi.org/10.5935/2177-1235.2022RBCP.623-pt
9. Wang HD, Alonso-Escalante JC, Cho BH, DeJesus RA. Versatility of Free Cutaneous Flaps for Upper Extremity Soft Tissue Reconstruction. J Hand Microsurg. 2017 Aug;9(2):58-66. doi: 10.1055/s-0037-1603918. Epub 2017 Jun 27. PMID: 28867904; PMCID: PMC5578827.
10. Wahyudi M, Satria O, Aprilya D, Nong I. Vertical Rectus Abdominis Myocutaneous Flap for Reconstruction of Forequarter Amputation Defect after Shoulder Soft Tissue Sarcoma Resection: Technical Consideration. Plast Reconstr Surg Glob Open. 2023 Jun 19;11(6):e5077. doi: 10.1097/GOX.0000000000005077. PMID: 37342308; PMCID: PMC10278745.
11. Scozzafave GAE, Abel JL, Bloch RJ, Andreoni WR, Pastro DAV, Miranda FBS, et al. Aplicações clínico-cirúrgicas do retalho antebraquial: análise de 89 casos. Rev. Bras. Cir. Plást.2010;25(2):361-366
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Palavras Chave

Retalho Miocutâneo; sarcoma; membro superior

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

Instituto de Assistência Médica ao Servidor Publico Estadual - São Paulo - Brasil

Autores

MARIA MADUREIRA MURTA, AN WAN CHING, ANDRE WANDERLEY DE OLIVEIRA GUIMARAES, VIVIAN CALVINO LAGARES SCALCO