Dados do Trabalho
Título
RETALHO MIOCUTANEO DO LATISSIMO DO DORSO ESTENDIDO PARA RECONSTRUÇAO DE PAREDE TORACIA ANTERIOR (REGIAO MAMARIA). UMA VOLTA AO PASSADO.
Resumo
A técnica de reconstrução mamária usando o retalho miocutâneo do músculo latíssimo do dorso (LD), inicialmente descrita por Iginio Tansini em 1896 e refinada na década de 1970, é discutida em relação à sua eficácia. Compara-se o uso do retalho total do LD com técnicas mais modernas que utilizam ilhas de pele ou retalhos poupadores de músculo, através de um caso de paciente com carcinoma espinocelular extenso (CEC) na área da mastectomia esquerda. O tratamento incluiu ressecção oncológica ampla e reconstrução das partes moles com o retalho LD. Os resultados mostraram uma recuperação positiva e rápida da paciente, apesar da perda parcial do enxerto de pele. Conclui-se que o retalho total do LD é uma opção eficaz para grandes reconstruções mamárias, particularmente quando a reconstrução do gradil costal está envolvida.
Introdução
A técnica de reconstrução mamária com a utilização de retalho miocutâneo do latíssimo do dorso (LD) foi descrita por Tansini em 1896. A sistematização moderna da técnica, como hoje é utilizada (em ilhas de pele), só apareceu na década de 1970 por Olivari, Schneider e Muhbauer. Hoje ela é considerada padrão ouro da reconstrução mamária. Uma paciente com extenso Carcinoma Espinocelular na área de mastectomia esquerda irradiada, nos trouxe o desafio da necessidade da cobertura de toda a região mamária esquerda. Fez-se necessário então uma volta ao passado para comparar o uso do retalho miocutâneo do latíssimo do dorso estendido clássico (voltando ao passado) ao invés das ilhas de pele hoje largamente utilizadas.
Objetivo
O emprego de retalhos miocutânos continua proporcionando excelentes resultados, tanto para o cirurgião quanto para a paciente. O objetivo deste trabalho é discutir o uso de um retalho estendido total do músculo Latíssimo do Dorso (inicialmente proposto na cronologia histórica da Cirurgia Plástica Reconstrutiva de Mama) versus às ilhas do retalho, atualmente mais utilizadas. Exemplifica-se tal discussão com imagens de uma paciente apresentando um Carcinoma Espinocelular Invasivo extenso com planejamento de excisão oncológica extensa, deixando um significativo defeito a ser reconstruído. Assim, comparamos descritivamente e didaticamente o uso do retalho estendido total de músculo Latíssimo do Dorso (ou Grande Dorsal) na reconstrução de tumor mamário de grandes dimensões, assim como historicamente descrito por Iginio Tansini em 1986 versus as ilhas de pele ou retalhos poupadores de músculo, baseados em perfurantes do ramo descendente da artéria toracodorsal.
Método
Paciente feminina, 49 anos de idade, com história de câncer de mama, mastectomizada há 4 anos com complementação de tratamento com quimio e radioterapia. Ao exame apresentava extenso tumor vegetante que ocupava quase toda a região torácica anterior esquerda. Exame histopatológico revelou tratar-se de carcinoma espinocelular. A ressecção oncológica foi realizada com ampla margem de segurança, nas partes moles associada à ressecção de 3 arcos costais na região mamária com exposição do pericárdio e pleura à esquerda. A mesma equipe realizou a reconstrução costal com tela de prolene e placa de metil metacrilato para proteção da área cardíaca. Finalmente, foi então promovida a reconstrução das partes moles com um retalho miocutâneo total do músculo LD, de acordo com o método original de Tansini, salvo pela esqueletização do pedículo vascular para facilitar a transposição. A área doadora original (uma das preocupações com relação à morbidade do retalho de LD estendido), foi coberta com enxerto de pele parcial, com auxílio do dermátomo de Brown, a partir de área doadora da face anterior da coxa esquerda.
Resultado
A evolução da paciente foi extremamente satisfatória, com alta do CTI em dois dias após a retirada do dreno de tórax e alta hospitalar em cinco dias. O retalho foi totalmente integrado, sem áreas de sofrimento ou secreções. Houve perda parcial do enxerto de pele parcial, o que foi provavelmente atribuído ao decúbito dorsal prolongado. Foi feita uma complementação da enxertia em vinte dias. A paciente teve um seguimento pós-operatório de dois anos, sem recidivas ou complicações no retalho do LD. O seu resultado imediato e a longo prazo surpreendeu favoravelmente, tanto quanto à viabilidade do extenso retalho, sem sofrimentos, quanto à ausência de recidivas ou alterações respiratórias. O óbice deste procedimento foi a necessidade do fechamento da sua área doadora com enxerto de pele parcial, o que provocou um considerável dano estético na região dorsal.
Discussão
Para o fechamento do extenso defeito deixado após uma segura ampla ressecção oncológica da lesão, optou-se por não utilizar o retalho pediculado do TRAM pela impossibilidade de ele cobrir as suas regiões mais cefálicas. O retalho originalmente descrito por Tansini mostrou-se adequado para esta tarefa. O padrão de circulação do músculo grande dorsal é do tipo V, de acordo com a Classificação de Mathes e Nahai. O pedículo dominante é composto da artéria toracodorsal, duas veias e o nervo toracodorsal. A artéria toracodorsal é um ramo da artéria subescapular decorrente da artéria axilar. Pedículos segmentares secundários entram na parte de baixo do músculo através de perfurantes laterais das artérias intercostais posteriores e das perfurantes mediais da artéria lombar adjacente ao local da origem muscular. Além disso numerosas perfurantes musculocutâneas se prolongam a partir desta rede vascular rica intramuscular na pele sobreposta e no tecido subcutâneo. São justamente estas perfurantes musculocutâneas que permitem a criação, de forma segura, de ilhas de pele em qualquer lugar dentro da margem do músculo. A primeira referência científica da utilização do músculo latíssimo do dorso na cirurgia reparadora deve-se à Iginio Tansini, um professor da Universidade de Pávia que, em 1896, descreveu um novo método para fechamento das feridas ocasionadas pelas mastectomias radicais daquela época, que produziam uma grave deformidade na parede torácica anterior, com perda cutânea e muscular. Tansini, para a maior segurança do retalho, recomendava a incorporação do músculo latíssimo do dorso ao retalho homolateral, originalmente de forma total, uma vez descrita a importância dos vasos perfurantes musculocutâneos a partir dos vasos toracodorsais. Após a descrição inicial por Tansini, foram descritos retalhos toracodorsais baseados em perfurantes e retalhos poupadores de músculo para redução de morbidade devido à complicações no sítio doador, seroma dorsal e necrose do retalho (descrito em 7% no retalho estendido elevado). Outra complicação possível diz respeito à necrose na pele do retalho dorsal, especialmente com grandes retalhos de pele, resultado em tensão excessiva sobre o fechamento dorsal. Outros possíveis problemas do local doador são perda de mobilidade e fraqueza do ombro, escápula alada e hérnia dorsal. Todas estas complicações são maiores nos casos do retalho total de grande dorsal se comparado ao retalho conservador em ilhas de pele.
Conclusão
Atualmente, apesar da técnica com ilhas de pele e retalhos toracodorsais baseados em perfurantes poupadores de músculo serem as mais utilizadas, o retalho total descrito por Tansini ainda pode ser utilizado com sucesso em grandes tumores ou defeitos na região mamária, nos quais a reconstrução do gradil costal possa estar incluída. Dadas as proporções e invasão local do tumor mamário, como no caso exemplificado, a opção de maior cobertura pode ser necessária. Mesma havendo tais complicações descritas e já relatadas, o retalho de grande dorsal é resistente e possui uma circulação excelente e confiável. O retalho de grande dorsal estendido pode fornecer 300 a 400 mL ou mais de volume de tecidos moles para a reconstrução de mama.
Referências
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Palavras Chave
Retalho Miocutâneo; Reconstrução de mama; neoplasias da mama
Arquivos
Área
Cirurgia Plástica
Categoria
Cirurgia Plástica
Instituições
Hospital da Plástica Rio de Janeiro - Rio de Janeiro - Brasil
Autores
BRENDA BHERING ANDRADE, SERGIO CARREIRAO, FARID HAKME