60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

REDE DE FIXAÇAO EM ENXERTOS CUTANEOS: UMA NOVA ALTERNATIVA AO CURATIVO DE BROWN

Resumo

Introdução: Os enxertos cutâneos são segmentos advindos da pele do próprio paciente com o objetivo de cobrir outra área desprovida de tecido epitelial após processo cirúrgico, como retirada de tumores ou fechamento de feridas amplas em que não é possível aproximar as bordas de pele circundantes A funcionalidade do enxerto e a cicatrização dependem do processo de aderência ao leito receptor O processo de aderência pode ser realizado de diversas formas, o método a ser escolhido depende da área e da extensão da ferida em que vai ser fixado o enxerto, bem como das condições clínicas do paciente.
Objetivo: apresentar uma nova forma de fixação dos enxertos como alternativa ao curativo de Brown e aos Pontos de adesão
Método: estudo observacional prospectivo do tipo série de casos avaliando pacientes em que foi utilizada a nova técnica proposta. Resultado: A taxa de integração dos enxertos foi equivalente às demais técnicas de fixação, não houveram casos de falha. O tempo cirúrgico para realização da rede foi inferior ao com uso de pontos separados de adesão e similar ao com realização de curativo de Brown. A possibilidade de uso de curativos simples associados a rede de fixação promoveu conforto e facilidade nos cuidados para os pacientes.
Conclusão: A Rede de Fixação de enxertos cutâneos em casos selecionados se mostra como uma alternativa segura, eficaz, de fácil reprodutibilidade técnica, sem aumento de tempo cirúrgico e confortável para o paciente

Introdução

Os enxertos cutâneos são segmentos advindos da pele do próprio paciente com o objetivo de cobrir outra área desprovida de tecido epitelial após processo cirúrgico, como retirada de tumores ou fechamento de feridas amplas em que não é possível aproximar as bordas de pele circundantes [1].
Os enxertos são classificados conforme a espessura da pele a ser usada no tratamento [2]. Para enxertos de pele totais, utiliza-se a derme e a epiderme, juntamente com as estruturas de anexo do tecido, possuem um melhor resultado estético pois ajudam a prevenir a contratura da pele [3]. Já o enxerto que é composto pela epiderme e por parte da derme, denomina-se de enxerto de pele parcial [3].
A funcionalidade do enxerto e a cicatrização dependem do processo de aderência ao leito receptor [4]. O processo de aderência pode ser realizado de diversas formas, o método a ser escolhido depende da área e da extensão da ferida em que vai ser fixado o enxerto, bem como das condições clínicas do paciente.
Existem técnicas já descritas e consagradas na literatura e prática médica, dentre elas o curativo de Brown e os Pontos de Adesão no leito receptor: O curativo de Brown é o curativo que visa a aplicabilidade de uma certa pressão uniforme para que o enxerto seja fixado, para isso, é utilizado uma gaze que é sobreposta sobre a região enxertada e fixada ao redor da área, deve ser retirada entre 5 a 7 dias após o procedimento [7]. A técnica descrita pela primeira vez em 1929, por Blair e Brown, defende que a pressão feita sobre a área enxertada promove uma maior revascularização e previne a formação de hematomas e seromas, e dessa forma, evitaria potencialmente as chances de necrose da área enxertada [7]. Contudo, as literaturas mais atuais comprovam que o curativo não excede a pressão capilar. Além disso, requer mais cuidados no pós-operatório, haja vista que a região fica fechada com a gaze, dificultando a inspeção da ferida [4].
O uso dos Pontos de Adesão no leito receptor tem sido proposto pois aumenta o conforto do paciente, haja vista que são utilizados pontos de sutura simples fixando o enxerto na área receptora, de forma que fique aderido sem que haja espaço para formação de hematomas [4]. Nesse caso, não se utiliza gaze para fixar o enxerto, aumentando o conforto do paciente no pós operatório, além de permitir que seja possível inspecionar a ferida com mais frequência. A utilização dessa técnica apresenta eficácia equivalente ao uso dos Curativos de Brown, com a vantagem da facilidade para cuidados com curativo no pós-operatório, mas acarretando em aumento do tempo cirúrgico e maior manipulação no seguimento para retirada dos pontos do leito.
Como alternativa para conseguir uma estabilidade adequada entre o enxerto cutâneo e o leito receptor - evitando assim o cisalhamento e a formação de hematomas e seromas, respeitando os princípios fundamentais para um processo de integração eficaz - associando o maior conforto para o paciente sem a necessidade de manter um Curativo de Brown e reduzindo o tempo cirúrgico e manipulação pós-operatória que os Pontos de Adesão demandam, apresentamos uma nova opção técnica: a Rede de Fixação em enxertos cutâneos – a partir de conceitos descritos por Auersvald [8] e aprimoramento dos Pontos de Adesão, utilizados de rotina pelo Serviço de Cirurgia Plástica da PUCRS.

Objetivo

Apresentar uma nova forma de fixação de enxertos cutâneos – Rede de Fixação , como alternativa ao curativo de Brown e aos Pontos de Adesão, utilizada em pacientes atendidos no Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital São Lucas da PUCRS que foram submetidos à reconstrução de defeitos pós-ressecção oncológica com utilização de enxertos de pele de espessura total

Método

Foi realizado um estudo observacional prospectivo do tipo série de casos com base em avaliação de prontuários e registros fotográficos dos pacientes. Os pacientes incluídos no estudo foram os submetidos a ressecções oncológicas de tumores de pele não-melanoma pelo Serviço de Cirurgia Plástica da PUCRS a partir de Abril de 2024 em que se utilizou a Rede de Fixação como técnica para estabilização do enxerto.
Foi realizada uma revisão dos prontuários, avaliando história médica pregressa, diagnóstico atual, local e extensão da lesão, descrição cirúrgica e evolução pós-operatória, tendo como ponto principal a análise da integração dos enxertos.
O parâmetro utilizado para análise da integração dos enxertos foi a observação clínica. Não se utilizaram ferramentas para mensuração quantificável.

Técnica cirúrgica

A técnica cirúrgica consistiu na retirada dos enxertos de pele total da região supra ou infraclavicular, com técnica cirúrgica padrão, realizando o preparo do enxerto com uso de tesoura de matzenbaun.
A fixação dos enxertos no leito foi realizada através de suturas nas bordas com Nylon 4.0 e 5.0, em conjunto com linhas de sutura contínuas no leito, garantindo a fixação do tecido transplantado na área receptora. A Rede de Fixação consiste em em suturas contínuas, com uso de Nylon 4.0 ou 5.0 de acordo com a espessura da pele do paciente, com entrada perpendicular no enxerto cutâneo e transfixação em 45o no leito receptor, com espaçamento varíavel entre os pontos, de acordo com a extensão da área enxertada.
Os curativos realizados consistiram em gaze com petrolatum preenchida com algodão mais gaze simples por cima, fixada com microporagem simples. Os curativos foram mantidos fechados por uma média de tempo variando entre 5 e 7 dias.
O seguimento ambulatorial foi realizado em pelo menos 3 consultas, sendo a primeira entre o 5º e 7º PO, a segunda entre o 12º e 15º e a terceira após 1 mês da realização da cirurgia.
As avaliações foram realizadas por diferentes examinadores, todos médicos-residentes de Cirurgia Plástica do Hospital São Lucas da PUCRS.

Resultado

O estudo segue em andamento.
Até o momento foram avaliados 6 pacientes submetidos a reconstrução com enxertia de pele em que utilizou-se a Rede de Fixação como técnica para estabilização do enxerto no leito
A taxa de sucesso das reconstruções foi plenamente satisfatória, a integração dos enxertos ocorreu em 100% dos casos.
A principal complicação ocorrida foi pequenas áreas de epidermólise em alguns casos, porém nenhuma com extensão considerável, e em nenhum caso prejudicando o resultado final das reconstruções
O tempo cirúrgico médio para realização da estabilização do enxerto com a Rede de Fixação foi equivalente à média para confecção de curativo de Brown no Serviço de Cirurgia Plástica da PUCRS, e mais rápida quando comparada a realização de Pontos de Adesão
Relatou-se uma comodidade importante por parte dos pacientes nos cuidados com curativo no pós-operatório, fato esse atribuído principalmente a possibilidade de realização de curativos simples.
Por parte da equipe cirúrgica relatou-se maior facilidade no seguimento pós-operatório em relação aos Pontos de Adesão, pela necessidade de retirada linhas de sutura continuas ao invés de múltiplos pontos simples

Discussão

O enxerto de pele propicia técnicas de reconstrução que melhoram a qualidade de vida e os resultados de pacientes queimados, traumatizados ou com câncer [1]. O enxerto de pele é um tecido retirado de uma área doadora - que não possui pedículo de vascularização – e transplantado para outra região onde existe um defeito a ser corrigido. Dessa forma, um novo suprimento vascular vai ser desenvolvido ao longo do tempo [5]. A capacidade de sucesso de um enxerto depende exclusivamente do suprimento sanguíneo do leito receptor, para isso, a fixação adequada da pele é de suma importância [6]. A pele pode ser fixada através de diversas técnicas, entre elas: o curativo de Brown, os Pontos de Adesão e, agora, a Rede de Fixação.
A técnica com uso de curativo de Brown para fixação dos enxertos já é consagrada e bem estabelecida na literatura. As taxas de sucesso com uso desse método não são inferiores a nenhuma outra alternativa proposta [4]. Contudo, trabalhos mais atuais discutem a real necessidade desse tipo de curativo, considerando-se os cuidados que ele demanda por parte do paciente, além do desconforto que causa e da impossibilidade de realizar uma inspeção da ferida operatória por parte do cirurgião [4]
Os pontos de adesão no leito receptor foram propostos pois aumentam o conforto do paciente, haja vista que são utilizados pontos de sutura simples fixando o enxerto na área receptora, de forma que fique aderido sem que haja espaço para formação de hematomas [4]. Nesse caso, não se utiliza gaze para fixar o enxerto, aumentando o conforto do paciente no pós operatório, além de permitir que seja possível inspecionar a ferida com mais frequência.
A Rede de Fixação surgiu como uma evolução da técnica de Pontos de Adesão, utilizando conceitos já presentes nessa forma de estabilização de enxertos e conceitos descritos por Auersvald na confecção da rede hemostática [8] de forma a adaptar para a necessidade nos enxertos cutâneos. A principal vantagem desta técnica se refere ao menor tempo cirúrgico em relação aos pontos simples – especialmente nos casos com áreas enxertadas maiores, em que se demandava maior tempo para confecção dos múltiplos pontos de adesão.
Não se nota uma melhora na taxa de integração nos enxertos entre as técnicas citadas.
Os casos avaliados neste estudo corroboram essas observações já descritas: a utilização da Rede de Fixação se mostrou um técnica que apresenta uma equivalência na eficácia para integração dos enxertos, somado a um maior conforto e segurança no período pós-operatório.
Áreas enxertadas muito pequenas ou com leito receptor muito delicado não são adequadas para a realização desta técnica, devendo-se optar pelo Curativo de Brown ou Pontos de Adesão.
A metodologia desse estudo não permite realizar conclusões definitivas sobre o tópico. É necessário realizar estudos prospectivos randomizados que compare as técnicas, idealmente com uso de ferramentas para avaliação objetiva das taxas de integração e eventuais pontos de necrose no processo pós-operatório das enxertias, além de formulários validados para avaliação do conforto do paciente no seguimento.

Conclusão

A Rede de Fixação de enxertos cutâneos em casos selecionados se mostra como uma alternativa segura, eficaz, de fácil reprodutibilidade técnica, sem aumento de tempo cirúrgico e confortável para o paciente.
Comparando-se a pequena amostragem de casos da nova técnica proposta realizados pelo Serviço de Cirurgia Plástica da PUCRS com a literatura existente e própria experiência do Serviço com as técnicas de Pontos de Adesão e Curativo de Brown não se percebe nenhuma perda de segurança ou resultado com a técnica apresentada, mas sim uma vantagem na questão de conforto e manejo pós-operatório para os pacientes e equipe médica.
Não são encontradas diferenças significativas entre os métodos de fixação discutidos acima, as taxas de formação de hematoma, infecção e necrose permanecem semelhantes quando comparados os três métodos de fixação [5]. Apesar do curativo de Brown ser amplamente difundido e mais utilizado, há que se considerar que a Rede de Fixação no leito propicia ao paciente maior conforto com a região das feridas, sem prejuízo nas taxas de sucesso de integração dos enxertos.

Referências

[1] Brandt, MG; Moore, CC Câncer de pele não melanoma. Plástico Facial. Cirurg. Clin. Norte Am. 2019 , 27 , 1–13. [ Google Scholar ] [ CrossRef ] [ PubMed ]
[2] Hou, C.-C.; Chou, Y.-Y.; Chen, S.-G.; Wang, C.-H.; Tzeng, Y.-S. Enxerto de pele de espessura total do triângulo submentoniano para reconstrução de defeitos faciais. J. Clin. Med. 2023 , 12 , 3195.
[3] Herskovitz I, Hughes OB, Macquhae F, Rakosi A, Kirsner R. Epidermal skin grafting. Int Wound J. 2016 Sep;13 Suppl 3(Suppl 3):52-6. doi: 10.1111/iwj.12631. PMID: 27547964;
[4] Steele L, Brown A, Xie F. Full-thickness Skin Graft Fixation Techniques: A Review of the Literature. J Cutan Aesthet Surg. 2020 Jul-Sep;13(3):191-196. doi: 10.4103/JCAS.JCAS_184_19. PMID: 33208994; PMCID: PMC7646424.
[5] Kromka W, Cameron M, Fathi R. Curativos de amarração versus suturas de alinhavo para o fechamento de enxertos de pele de espessura total: uma revisão da literatura. Jornal de Medicina Cutânea e Cirurgia . 2018;22(6):602-606.
Cutânea e Cirurgia . 2018;22(6):602-606.
[6] Andreassi A, Bilenchi R, Biagioli M, D'Aniello C. Classification and pathophysiology of skin grafts. Clin Dermatol. 2005 Jul-Aug;23(4):332-7. doi: 10.1016/j.clindermatol.2004.07.024. PMID: 16023927.
[7] F. K. Seymour, H.P Giele. Tie-overs under pressure. Journal of surgical reconstruction. 2003 July.
[8] Auersvald A, Auersvald LA. Hemostatic net in rhytidoplasty: an efficient and safe method for preventing hematoma in 405 consecutive patients. Aesthetic Plast Surg. 2014 Feb;38(1):1-9. doi: 10.1007/s00266-013-0202-5. Epub 2013 Aug 16.

Palavras Chave

Rede de Fixação; Enxertos; Brown

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

Hospital São Lucas da PUCRS - Rio Grande do Sul - Brasil

Autores

LUCAS STEFFEN, MILTON PAULO DE OLIVEIRA, GUILHERME AUGUSTO HETTWER, ADRIANO CALCAGNOTTO GARCIA