60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

RECONSTRUÇAO DE BOLSA ESCROTAL E PENIS EM PACIENTE COM GANGRENA DE FOURNIER: UM RELATO DE CASO

Resumo

A síndrome de Fournier é uma infecção polibacteriana, geralmente causada por bactérias anaeróbias e aeróbias, sendo caracterizada por fasciite necrosante escrotal e perineal. Geralmente causa perda de grande área de tecido, podendo espalhar-se para outras áreas além do períneo, como abdome, membros inferiores, dorso, tórax e retroperitônio. Seu tratamento inclui desbridamento, antibioticoterapia de amplo espectro e terapia com oxigênio em câmara hiperbárica. A reconstrução com descolamento de retalhos e liberação de tecidos mostrou-se uma boa opção para cobertura cutânea peniana e de bolsa escrotal. O objetivo desse trabalho é relatar o caso de um paciente com Gangrena de Fournier, onde foi optado como tratamento cirúrgico,após desbridamento, a reconstrução de bolsa escrotal e pênis.

Introdução

Gangrena de Fournier é um termo que foi descrito pela primeira vez em 1883 por Alfred Fournier para designar fasciites necrosantes que acometem o escroto e o períneo. Fournier concluiu que três achados caracterizavam a síndrome: início súbito em homens jovens e saudáveis, rápida progressão e ausência de agente etiológico específico 1.
Em 1889, Manchot descreveu em detalhes o suprimento arterial da região perineal. Dividiu a região genital em duas áreas de vascularização, porção anterior e posterior. A região anterior é vascularizada na sua maior parte pela artéria pudenda superficial externa e artéria pudenda profunda externa. A região posterior é suprida pela artéria pudenda interna, que dá ramos medial e lateral. Os ramos laterais alcançam a porção ínfero-medial do músculo glúteo máximo e vascularizam a região. Os ramos mediais vascularizam a pele da região perianal e da região ínfero-medial do músculo glúteo máximo. A artéria glútea inferior também contribui com o suprimento sanguíneo da pele, anastomosando-se com os ramos da artéria pudenda interna 2.
Em geral a Gangrena de Fournier acontece em pacientes imunodeprimidos, como diabéticos, aidéticos, alcoólatras, idosos, pacientes de baixo índice socioeconômico e desnutridos. O foco inicial da doença geralmente se deve por trauma ou infecção na região perianal ou da via urinária. Essa infecção causa necrose tecidual rápida e estado toxêmico significativo, e se não for tratada precoce e agressivamente pode causar a morte do paciente 3.
O quadro clínico pode se manifestar com dor, eritema e edema, cianose e crepitação em bolsa escrotal e períneo associada ou não a febre e calafrios 4.
O tratamento inclui amplo debridamento, antibioticoterapia de amplo espectro e oxigenioterapia hiperbárica, para eliminar a infecção e proteção dos testículos expostos, com reconstrução da região perineal e peniana. O defeito de cobertura resultante do debridamento dos tecidos afetados pode ser extenso, com exposição dos testículos, pênis, parede abdominal e funículo espermático. Há diversas alternativas para fechamento do defeito resultante do tratamento cirúrgico inicial 5.
De um modo geral, feridas pequenas, com perdas teciduais de até 50% do escroto, podem ser tratadas com cicatrização por segunda intenção, síntese primária e enxerto de pele. Perdas maiores costumam ser tratadas utilizando retalhos cutâneos, fasciocutâneos ou miocutâneos 5.

Objetivo

O objetivo desse relato é descrever um caso da Clínica de Cirurgia Plástica do Hospital Naval Marcílio Dias em reconstruções de pênis e bolsa escrotal em paciente com Gangrena de Fournier.

Método

Foi realizado um estudo transversal, em um caso de um paciente do sexo masculino, com 70 anos, pardo, que deu entrada no Hospital Naval Marcílio Dias no dia 02/12/2022 apresentando tecido necrótico extenso em região genital associado à dor,prurido,disúria e eritema. Neste mesmo dia, paciente foi submetido à desbridamento de todo tecido necrotico em pênis e escroto(poupando corpos carvenosos, uretra e testículos). Foi enviado material para cultura e iniciado ciclo de antibioticoterapia desde o momento do diagnóstico com objetivo de atingir germes Gram positivos, Gram negativos e anaeróbios.
Os cuidados locais com a ferida consistiram de limpezas com clorexidina degermante, uso de creme de sulfadiazina de prata a 1%, uso de malha de baixa aderência impregnada com prata nanocristalina, aquacell e fibras de alginato de cálcio.
O paciente foi submetido no dia 30/01/2023 à remoção de todo tecido de granulação aparente, reavivamento de bordos de bolsa escrotal, avanço de bolsa escrotal residual, com fechamento completo da mesma sem tensão e colocação de dreno penrose 2. Além disso, foi realizado no mesmo ato cirúrgico, enxertia de corpo de pênis(àrea doadora em Fossa Ilíaca Direita).

Resultado

O paciente segue após o tratamento cirúrgico aos cuidados na enfermaria. Não houve necessidade de derivação do trânsito intestinal para controle do processo infeccioso. Não houve intercorrências no período pós-operatório imediato e o paciente apresentou cobertura cutânea de bolsa escrotal adequada.

Discussão

A gangrena de Fournier é uma condição rara mas grave que afeta a área genitourinária, incluindo a bolsa escrotal e o pênis. É causada por uma infecção bacteriana aguda que afeta a pele e os tecidos moles dessa região. A reconstrução da bolsa escrotal e do pênis é uma opção cirúrgica para pacientes com gangrena de Fournier1.
Os tecidos residuais do escroto são os mais adequados para cobrir os testículos expostos. Para tal, é necessário ressecar o tecido de granulação que encarcera as estruturas da área cruenta, para permitir a expansão da pele retraída. Esta dissecção é realizada em plano abaixo do músculo de dartos e é facilitada pela disposição estratiforme das estruturas anatômicas, que cria um bom plano de clivagem e, feita de forma cuidadosa, pode atingir toda a extensão da bolsa remanescente3.

Após a cirurgia, é importante que o paciente siga as instruções de cuidados pós-operatórios para evitar complicações e garantir uma recuperação adequada. Isso inclui o uso de curativos, medicamentos para dor e antibioticoterapia. A reabilitação pode ser necessária para ajudar o paciente a recuperar a função sexual e urinária5.

No paciente em questão, na abordagem cirúrgica, foi realizado uma reconstrução de bolsa escrotal, com necessidade de uso de enxerto em pênis.

Conclusão

A reconstrução com liberação de tecidos mostrou-se uma boa opção para cobertura cutânea de bolsa escrotal, assim como uso de enxertos em região peniana. Com essas duas técnicas cirúrgicas, conseguimos prover uma boa vascularização e manter a permeabilidade uretral.

Desta forma, observamos que com dissecção ampla e cuidadosa da pele remanescente da bolsa escrotal, podemos cobrir extensas áreas cruentas, proporcionando proteção adequada dos testículos.

Referências

1. Kılıç A, Aksoy Y, Kılıç A. Fournier’s gangrene: etiology,treatment, and complications. Ann Plast Surg, 2001 PMID: 11716264

2. Candelária PAP, Klug WA, Capelhuchnik P, Fang CB. Síndrome de Fournier: análise dos fatores de mortalidade. Rev Bras Colo-proctol. 2009;29(2):197-202.

3. Andrade ACH, Amarante MTJ, Ferreira MC, Lodovici O. Cirurgia reparadora na sequela da síndrome de Fournier. Rev Assoc Med Bras. 1991;37(1):22-6


4. LÓPEZ, M. LAURENTYS-MEDEIROS, J. Semiologia Médica, as Bases do Diagnóstico Clínico. 4. ed. Rio de Janeiro: Editora Revinter Ltda, p. 827, 2001.

5. NORTON, KS JOHNSON, LW PERRY, KH SEHON, JK ZIBARI, GB. Management of Fournier’s gangrene: an eleven year retrospective analysis of early recognition, diagnosis, and treatment. Lousiana State University Health Sciences Center-Shreveport, USA. Aug; 68(8) p. 709-13, 2002.
Fournier’s Gangrene; Necrotizing Fasciitis; Penis; Scrotum;Reconstructive Surgical Procedures; Surgical Flaps

Palavras Chave

GANGRENA DE FOURNIER

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

HOSPITAL NAVAL MARCILIO DIAS - Rio de Janeiro - Brasil

Autores

NICOLE PTAK BIRMAN