Dados do Trabalho
Título
O USO DA LIPOENXERTIA EM CIRURGIA DE MAMA NO SERVIÇO DE RESIDENCIA MEDICA DO HOSPITAL DA PLASTICA
Resumo
A lipoenxertia para fins estéticos e reconstrutivos da mama tem avançado em sua coleta, preparo, aplicação e tecnologia desde o seu desenvolvimento por Yllouz em 1983, trazendo para a cirurgia plástica um arsenal de grande importância. Sua segurança e eficácia cientificamente comprovadas permitem que a lipoenxertia seja associada à cirurgia mamária em técnicas de mamoplastia de aumento, que não se limitam exclusivamente ao uso de próteses mamárias, mas também possuem indicações amplas, como nos explantes, mamoplastia de aumento secundária, reconstrução mamária e correção de deformidades. O resultado é um refinamento do contorno corporal, tornando-o mais natural, com baixo índice de complicações e fácil obtenção, o que evidencia a necessidade de aprendizado desse procedimento durante o programa de residência em cirurgia plástica.
Introdução
A transferência autóloga de gordura, que tem sido cada vez mais utilizada na cirurgia plástica nas últimas décadas, foi realizada pela primeira vez por Neuber em 1893 para o reparo de defeitos faciais e em mamas por Czerny em 1895 (1). Com o advento da lipoaspiração e sua popularização por Yllouz em 1983, a lipoenxertia ganhou espaço tanto na cirurgia plástica estética como reparadora. Assim, a indicação da lipoenxertia em mamas vai desde o reparo e correção de deformidades, reconstrução de mama, explantes e mamoplastias primárias e secundárias com objetivo de melhorar o contorno corporal (2).
No entanto, a restrição imposta em 1987 pela Sociedade Americana de Cirurgia Plástica aos procedimentos que envolvem transferência de gordura para a mama constituiu um claro obstáculo ao desenvolvimento nesta área (3). O motivo foi que a utilização de enxertos de gordura em grandes volumes para fins de aumento mamário pode levar a microcalcificações radiológicas no pós-operatório e sua incapacidade de distinguir as microcalcificações causadas por enxertos de gordura do câncer de mama usando as técnicas de imagem da época. Contudo, os estudos continuaram e em 2009 a Sociedade reviu seu posicionamento e permitiu novamente o seu uso, advertindo que o resultado é dependente da técnica e expertise do cirurgião (4).
Dentre as desvantagens do uso da lipoenxertia, a maior limitante é a imprevisibilidade do resultado final que depende da neovascularização do enxerto tendo risco de necrose gordurosa, cistos oleosos e microcalcificações (5). Apesar disso, seu uso é difundido pelos benefícios maiores como fácil obtenção, baixo índice de complicações, custo baixo, biocompatíveis quando comparados a implantes e outros materiais e podem ser obtidos de vários locais doadores no corpo humano que são adequados para a coleta de gordura e repetidos em determinados intervalos de tempo (6).
Objetivo
Avaliar as cirurgias de mama nas quais foram utilizadas lipoenxertia para melhora do contorno corporal em casos de explante e mamoplastia redutora.
Método
Foram avaliadas 4 pacientes no período de fevereiro a novembro de 2023 candidatas ao explante ou redução mamária com posterior uso da gordura para obtenção de um melhor contorno da mama. Todas as pacientes incluídas no estudo realizaram exames pré-operatórios de ultrassonografia e apenas aquelas com categoria 1 ou 2 do American College of Radiology Breast Imaging Reporting and Data System (ACR BI-RADS) foram submetidas a cirurgia. Todas tiveram que assinar um termo de consentimento que apresentava complicações potenciais de infiltração de gordura na mama.
A marcação das áreas de lipoaspiração para obtenção de gordura para a posterior enxertia foi feita com o paciente em pé, de forma estática e dinâmica.
Iniciamos o procedimento cirúrgico pela obtenção da gordura das áreas doadoras. A área é infiltrada com solução fisiológica de cloreto de sódio a 0,9% contendo 1:500.000 de adrenalina usando seringa de 60 ml acoplada a uma cânula romba de 3 mm inserida através de uma pequena incisão na área selecionada a ser lipoaspirada e aguardando 15 minutos após.
A gordura é aspirada pelo método manual com seringa e cânulas de 3 ou 3,5 mm. As áreas doadoras podem incluir áreas de gordura abdominal, flancos, coxas e joelhos. O tecido adiposo aspirado é tratado com decantação: a seringa é mantida verticalmente com a extremidade aberta para baixo, a gordura se separa do sangue e após 10-15 minutos, obtem-se um sobrante limpo. Essa gordura é colocada em seringas de 10 ml para facilitar e melhor precisar os volumes necessários em cada área de injeção após a cirurgia de explante ou redução, priorizando a correção de assimetrias entre as mamas e posteriormente o aumento de volume. A gordura é injetada de forma retrógrada nos espaços subcutâneo e intraglandular usando uma cânula de 3 mm acoplada a uma seringa de 10 ml com múltiplas passagens, injetando apenas uma pequena quantidade em cada passagem.
Resultado
No total de 4 pacientes que foram submetidas a lipoenxertia de mama, 2 delas foram após explante e as demais após mamoplastia redutora na técnica de pedículo inferior. A idade das pacientes variou de 26 a 71 anos. A lipoenxertia de todas foi feita em um único tempo cirúrgico e a quantidade total de gordura transplantada em cada mama variou de 40 a 240 ml.
As complicações incluíram pequenas áreas de equimoses em 3 pacientes e 1 hematoma. Os hematomas foram resolvidos sem qualquer intervenção. Todas as pacientes tiveram uma melhora significativa no tamanho e/ou formato das mamas no pós-operatório.
Discussão
A gordura enxertada tem muitos dos atributos de um preenchimento ideal de tecidos moles, mas os resultados, como os de qualquer procedimento, dependem da técnica. Não existem evidências quantitativas da sobrevivência clínica da gordura e da previsibilidade da restauração do volume mamário, mas há muitos relatos de satisfação dos pacientes com esse procedimento (7). O sucesso da lipoenxertia autóloga na mama depende de muitos fatores: as técnicas e instrumentos utilizados para a coleta do tecido adiposo, o processamento da gordura, o volume de gordura implantada, o níveis de colocação de gordura, e até mesmo o paciente individualmente (2).
A lipoenxertia como artificio pode ser necessária para melhoria do contorno corporal, porém, o objetivo final frequentemente não é alcançado em um único procedimento. Além disso, previne complicações maiores e garante melhor integração do enxerto.
Em relação a segurança da lipoenxertia, o primeiro princípio é a lipoinjeção no plano ideal. O tecido subcutâneo, adiposo e intraglandular possuem rica vascularização. Ao injetar gordura em áreas com rico suprimento sanguíneo, há uma maior chance de sobrevivência e integração dos adipócitos com o tecido circundante. O segundo princípio é que o método de injeção deve ser radial retrógrado injetando em planos diferentes (7).
Mesmo aplicando todos esses princípios, complicações ainda podem estar presentes como necrose gordurosa, formação de cistos e calcificações aparecendo como lesões benignas da mama em exames radiológicos (9). Tal procedimento deve ser evitado em casos de histórico familiar de câncer de mama (10).
Segundo a Sociedade Americana de Cirurgia Plástica, o acompanhamento por imagem dessas lesões é suficiente, reduz o número de biópsias ou exames complementares desnecessários e evita possíveis atrasos no diagnóstico do câncer de mama (2).
Conclusão
O uso da gordura mostra ser um caminho de um futuro promissor na cirurgia plástica e na medicina regenerativa e por isso seu estudo se torna de extrema importância. Sua aplicabilidade extrapola o âmbito da estética e alcança a reconstrução mostrando segurança e eficácia.
Referências
(1) Boggio, Ricardo; Calazans, Denis (eds.). A Cirurgia Plástica em Capítulos - Tronco/Boggio, Ricardo; Calazans, Denis - Rio de Janeiro: DOC, 2021.
(2) Illouz YG, Sterodimas A. Autologous fat transplantation to the breast: a personal technique with 25 years of experience. Aesthetic Plast Surg. 2009;33(5):706-15. PMID: 19495856 DOI: http://dx.doi. org/10.1007/s00266-009-9377-1
(3) Illouz YG (1983) Body contouring by lipolysis: a 5-year experience with over 3000 cases. Plast Reconstr Surg 72(5):591–597
(4) Report on autologous fat transplantation. ASPRS Ad-Hoc Committee on New Procedures, September 30, 1987. Plast Surg Nurs. 1987;7:140–1.
(5) Trojahn Kolle SF, Oliveri RS, Glovinski PV, et al. Importance of mesenchymal stem cells in autologous fat grafting: a systematic review of existing studies. J Plast Surg Hand Surg. 2012;46:59–68.
(6) Bayram Y, Sezgic M, Karakol P, Bozkurt M, Filinte GT. The use of autologous fat grafts in breast surgery: A literature review. Arch Plast Surg. 2019 Nov;46(6):498-510. doi: 10.5999/aps.2019.00416. Epub 2019 Nov 15. PMID: 31775202; PMCID: PMC6882697.
(7) Coleman SR, Saboeiro AP. Fat grafting to the breast revisited: safety and efficacy. Plast Reconstr Surg. 2007;119:775–85.
(8) Missana MC, Laurent I, Barreau L, Balleyguier C. Autologous fat transfer in reconstructive breast surgery: indications, technique and results. Eur J Surg Oncol. 2007 Aug;33(6):685-90. doi: 10.1016/j.ejso.2006.12.002. Epub 2007 Jan 22. PMID: 17241760.
(9) Coleman SR, Saboeiro AP. Primary Breast Augmentation with Fat Grafting. Clin Plast Surg. 2015 Jul;42(3):301-6, vii. doi: 10.1016/j.cps.2015.03.010. PMID: 26116935.
(10) Carvajal J, Patiño JH. Mammographic findings after breast augmentation with autologous fat injection. Aesthet Surg J. 2008 Mar-Apr;28(2):153-62. doi: 10.1016/j.asj.2007.12.008. PMID: 19083521.
Palavras Chave
lipoenxertia; Mamoplastia;
Arquivos
Área
Cirurgia Plástica
Categoria
Cirurgia Plástica
Instituições
Hospital da Plástica - Rio de Janeiro - Brasil
Autores
LETICIA MORIKAWA, MARIELE RIBEIRO NUNES VITORAZZI, GABRIELLA PIMENTEL RONDON DE ASSIS, ALINE CARRER BORTOLINI, DAYANE ADENIR SHIZUKO TAKATA RIBEIRO, ALCEMAR MAIA SOUTO